São Paulo, domingo, 6 de setembro de 1998

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Que venha o comunismo

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Já dá para parodiar a famosa frase de Winston Churchill, segundo a qual a democracia é o pior dos regimes, exceto os outros. Agora, cabe dizer que o comunismo é o melhor dos sistemas, exceto para os países que o experimentaram.
Explico: 1 - O comunismo é uma droga, a começar pela supressão das liberdades públicas, o que, para o meu gosto, já é suficiente para desqualificá-lo sem precisar mencionar qualquer outro defeito.
2 - Mas o comunismo embutia a promessa de uma utopia igualitária que, embora na prática tenha se cumprido muito parcialmente, poderia seduzir o restante do mundo.
Por isso, os países centrais trataram de preparar um colchão social que amenizasse o caráter intrinsecamente impiedoso do capitalismo.
3 - Nos países periféricos, a disputa de influência entre a URSS e o Ocidente rendeu migalhas que, de todo modo, ajudaram a amortecer as dificuldades dos que pouco têm. Para estes, algo é sempre algo.
4 - Com a falência do comunismo, o capitalismo ficou livre para dar rédea solta ao seu "saco de maldades".
Veja-se o caso da Indonésia. O Ocidente sustentou por 32 anos uma ditadura podre, apenas como dique de contenção contra o comunismo. No percurso, houve até desenvolvimento e certos avanços sociais.
Agora, no entanto, quando o dique de contenção não é mais necessário, o "saco de maldades" levou a Indonésia a um colapso de tal grandeza que o mais recente estudo da ONU mostra que, no ano que vem, 140 milhões dos 202 milhões de indonésios cairão abaixo da linha de pobreza. Hoje, os pobres são 75 milhões.
Parece evidente que o capitalismo só não é selvagem quando há uma alternativa a ele. O que, aliás, nem é novidade. Shakespeare já fazia o rei Cláudio dizer, em "Hamlet", que "as loucuras dos grandes não devem ficar sem vigilância". Hoje, estão.



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