São Paulo, segunda-feira, 06 de outubro de 2008

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RUY CASTRO

Pelados pelo avesso

RIO DE JANEIRO - Há um cadáver pendurado em cada poste nas esquinas do Rio. Não um cadáver de verdade, como os produzidos nos morros e quebradas do tráfico, mas os expostos nos estandartes que anunciam a mostra "Corpo Humano - Real e Fascinante". Em 2007, essa exposição foi visitada por 450 mil pessoas em São Paulo. Chega agora ao Rio, sem faltar um cóccix ou glândula pituitária.
E com um aparato inédito. Graças à medida do prefeito Kassab, que livrou São Paulo de outdoors, cartazes, faixas e outros detritos urbanos, os paulistanos não tiveram as ruas decoradas com as imagens dos corpos dissecados. Quem quisesse vê-los -ao vivo, com perdão pelo oximoro-, que fosse à Oca, no Ibirapuera. No Rio, que ainda não adotou o Cidade Limpa, dispensa-se ir ao Museu Histórico -basta sair de casa e olhar em torno.
São como raios-X hiper-realistas, em cores e 3-D, mostrando como somos por dentro, do ponto de vista muscular, nervoso, esqueletal, circulatório, digestivo, urinário e respiratório -uma espécie de strip-tease pelo avesso, com requintes de "grand-guignol", inspirado por Freddy Krueger.
Na museu, os 16 cadáveres que servem de modelos e os 225 órgãos avulsos podem ser realmente fascinantes -no item necrofilia ou para quem tem um chiquê por fetos, tripas, tumores. Na rua, à porta de restaurantes, hospitais ou barbearias, causa impressão o anúncio de um cadáver com suas intimidades à vista. Eu próprio já começo a achar difícil entrar num estabelecimento e pedir iscas de fígado ou miolos à milanesa. Steak tartare, nem pensar.
Os corpos na exposição são de chineses e foram doados em vida. Com a obsessão pela produtividade que assola a China, é natural que alguns de seus cidadãos queiram continuar trabalhando mesmo depois de mortos.


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