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DIREITO DE NÃO VOTAR
A Comissão de Constituição e
Justiça do Senado aprovou proposta de emenda constitucional
(PEC) que acaba com o voto obrigatório no país. Para valer, a PEC precisa receber os votos de 3/5 dos senadores e 3/5 dos deputados em dois
turnos em cada casa. É difícil, portanto, que o voto facultativo venha a
ser aprovado sem um acordo entre as
principais lideranças do Congresso.
Existem muitos argumentos políticos tanto contra como a favor do voto obrigatório. Mas a proposta de
acabar com esse instituto merece
apoio por razões filosóficas.
A distinção fundamental foi proposta pelo pensador alemão Immanuel Kant (1724-1804). Numa versão
muito simplificada do que afirmou o
filósofo de Königsberg, há duas formas de cumprir uma regra. Pode-se
agir "de acordo com o dever", ou
"pelo sentido do dever". O motorista
que respeita a velocidade máxima de
uma estrada por medo de receber
uma multa age "de acordo com o dever". Mas um outro motorista pode
observar o limite de velocidade por
acreditar que ele está de acordo com
a racionalidade humana, que proporciona segurança e promove a paz
no trânsito, por exemplo. Este age
"pelo sentido do dever". Ele é, para
Kant, mais livre do que o primeiro.
Ao tornar o voto obrigatório, nós
de algum modo reduzimos o grau de
liberdade que existe por trás da decisão espontânea do cidadão de ir à seção eleitoral e escolher um candidato. E o eleitor que vota livremente é
um eleitor mais autônomo, mais
consciente. Seu voto também tende a
ser qualitativamente melhor do que o
daquele que vai à urna apenas porque a lei exige que ele assim o faça.
O saudável ceticismo recomenda
que não se aposte na adoção do voto
facultativo no Brasil. Os parlamentares que podem aprovar essa proposta
foram eleitos num regime de voto
obrigatório, o que já faz com que tendam a mantê-lo. Mas há poucas dúvidas de que, ao menos no plano teórico, o país sairia ganhando com o
fim desse anacronismo político.
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