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São Paulo, sábado, 06 de dezembro de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

A nova direita

RIO DE JANEIRO - Um filme francês antigo termina numa baita confusão, sacristão fugindo com a mulher do delegado, todos roubando de todos, nem o vigário escapa, nem as virgens, nem os devassos. Surge então um personagem que constata o óbvio e grita para si mesmo: "Uma onda de demência varre Clochemerle!".
Em linhas gerais, pode-se aplicar esse final a todo um continente, quiçá (em homenagem ao Benedito Valadares) ao mundo todo. Mas na Europa, sobretudo, há uma onda de insânia que está alimentando, por tortuosos caminhos ideológicos, o ideário não apenas da extrema direita mas de algumas forças daquilo que costumam chamar de "centro".
É o horror ao imigrante, ao ex-colonizado pela própria Europa que adquiriu sua liberdade política, mas está longe de se auto-sustentar. Turcos na Alemanha, africanos do sul, do centro e do norte na Comunidade Européia, asiáticos e até mesmo considerável massa de latino-americanos desabam de todas as formas, principalmente as ilegais, nos países da economia estabilizada ou em crescimento, a maioria deles ex-colonizadores.
Tal como nos Estados Unidos, que gradativamente reservaram para seus cidadãos os andares superiores da pirâmide social, deixando a mão de obra para os novos escravos do sistema capitalista, na Europa o mesmo está acontecendo, criando o paradoxo que alimenta as reivindicações da nova direita.
De um lado, a necessidade de abrir a porteira do mercado de trabalho para os que chegam massivamente em busca de empregos e da sociedade do bem-estar. De outro, o inchamento demográfico dos guetos que se vão criando nas grandes cidades, misturando religiões, costumes e comportamentos que ameaçam as tradições que formam o núcleo do pensamento conservador.
Na França, na Itália, na Espanha, na Alemanha e até mesmo em Portugal, pouco a pouco, aumenta o número de saudosistas dos regimes que pregavam a pureza racial.


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