São Paulo, terça-feira, 07 de setembro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

O poder e o operário

SÃO PAULO - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vive se orgulhando pelo fato de um típico representante do andar de baixo ter chegado até onde ele chegou. Tem toda a razão, mas, infelizmente, essa é uma história ainda incompleta.
Qual é a graça de um operário chegar à Presidência se, nela, faz a mesmíssima política que patrões e doutores fizeram antes dele?
Lula é o mais conservador dos presidentes, desde a volta da democracia, se se retirar da palavra "conservador" a carga ideológica e usá-la apenas no sentido de aquele que preserva o que encontrou.
José Sarney encontrou um vasto entulho autoritário, e seu governo removeu-o inteirinho, a ponto de legar o mais completo leque de liberdades democráticas da história. Fernando Collor encontrou um país fechado e abriu-o de forma irreversível. Itamar Franco encontrou o já crônico problema da inflação e derrubou-a.
Fernando Henrique Cardoso encontrou um Estado de mil braços e privatizou tudo o que pôde.
Repito: não estou fazendo juízo de valor, não estou dizendo que a abertura de Collor foi boa ou ruim, que as privatizações de FHC foram boas ou ruins. Estou relatando fatos.
Que mudança introduziu Lula? Zero. O resultado de algumas políticas pode ser melhor ou pior, conforme as circunstâncias internas ou externas, como se dá no caso da balança comercial. Mas é falso dizer que as políticas são diferentes
O resultado externo é uma soma de câmbio (desvalorizado no governo anterior), apetite pantagruélico da China por "commodities", com o conseqüente aumento do preço destas, e também da atuação de um ministro craque na área (Luiz Fernando Furlan). Mas a política é igual.
Antes de ficar cego de orgulho, Lula deveria pensar nos exemplos de outros do andar de baixo que também chegaram ao poder, como o polonês Lech Walesa, hoje no ostracismo, e o peruano Alejandro Toledo, campeão de impopularidade em uma região em que os governantes não são propriamente idolatrados.


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