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CARLOS HEITOR CONY
A universidade do crime
RIO DE JANEIRO - Os 50 anos da Petrobras foram comemorados com
anúncios publicados em jornais, um
de São Paulo, outro do Rio. Reproduziram-se as capas das edições de 3 de
outubro de 1953, tanto da Folha como de "O Globo", respectivamente.
Foi bom lembrar como era confusa
a paginação e o texto de um tempo
em que a regra nas secretarias de Redação era mandar descer as matérias
de qualquer modo, os linotipistas arrumavam tudo como podiam, misturando tipos e tamanhos, prensava-se
naquele papelão poroso (flan) e, numa operação que tinha alguma coisa
de medieval, derramava-se chumbo
fervendo e obtinha-se uma telha côncava e brilhante que ia para a rotativa imprimir o papel.
Gastei alguns anos de minha vida
fazendo isso, para ter a discutível glória de, madrugada alta, ir para casa
carregando o primeiro exemplar do
jornal vomitado pela Hoe ou pela
Marinone.
Não era sobre isso que iria escrever
hoje. Li numa dessas páginas de 50
anos atrás a frase que se tornaria famosa de Nelson Hungria, então ministro do Supremo Tribunal Federal,
dizendo que "os nossos reformatórios
são a escola primária, a escola secundária e a escola superior do crime!",
com direito ao ponto de exclamação,
que foi abolido pelos copidesques
posteriores, que pasteurizaram o texto, castrando-o da emoção, do pasmo, da indignação.
Bem, deixemos pra lá essas birras
de um antigo profissional das velhas
oficinas que cheiravam a chumbo e
ardiam como caldeiras infernais.
Queria lembrar que a situação não
mudou muito de Nelson Hungria para cá. Os presídios, as celas nas delegacias policiais continuam sendo a
universidade do crime -do primeiro
grau ao mestrado e doutorado. Até
hoje, passados tantos anos, a sociedade e o governo não encontraram outro meio de recuperar o preso, limitando-se a puni-lo e a formá-lo na
carreira do crime.
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