![]() São Paulo, quinta-feira, 07 de novembro de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Fila para transplante de fígado SILVANO RAIA
O critério de prioridade na fila de
transplantes de fígado tem sido
motivo de muita discussão, merecendo
comentários em editorial nesta Folha
no dia 8/10 ("Fila de transplantes", pág.
A2). Entretanto resultados de uma recente pesquisa justificam que o tema seja abordado mais uma vez.
Foram analisados retrospectivamente 237 transplantados no Hospital das Clínicas, de 1º/11/95 a 30/7/01, relacionando o índice Meld no pré-operatório com o resultado do transplante. Foram comparados dois subgrupos: um, de 126 pacientes menos graves, com Meld médio de 9,4, e outro, de 111 pacientes, mais graves, com Meld médio de 20,1. Obteve-se uma informação da maior importância. As curvas de sobrevida de cada subgrupo são estatisticamente diferentes entre si. O subgrupo com índice Meld mais baixo apresentou mortalidade de 15% nos primeiros seis meses após o transplante, ao passo que, nos com Meld mais alto, esse percentual foi de 26%. Demonstrou-se que a mortalidade dobra a cada aumento de 15 pontos na escala Meld. Por meio da equação obtida, estima-se que, nos pacientes com Meld igual ou superior a 40, a mortalidade após o transplante ultrapasse 50%. Esses resultados evidenciam o erro que seria adotar o critério Meld aqui no Brasil. Em países com captação de órgãos muito eficiente é possível transplantar todos os inscritos na lista num período não superior a seis meses. Nessas circunstâncias, pode-se dar prioridade aos casos mais graves, apesar da maior mortalidade nos primeiros meses após a cirurgia. Entretanto, no Brasil, pela falta de enxertos, apenas 10% dos inscritos são transplantados a cada ano, após uma espera de cerca de 24 meses. Nessas circunstâncias, se adotássemos o critério de gravidade Meld, estaríamos preterindo os candidatos com maior probabilidade de se beneficiar do transplante até quando apresentassem um Meld suficientemente alto, que lhes conferisse prioridade. Ressalte-se que, devido ao longo tempo de espera, que permaneceria inalterado, seriam operados apenas pacientes com Meld muito elevado. Na realidade, estaríamos substituindo a mortalidade na lista de espera por mortalidade pós-operatória precoce. Percebe-se, assim, que a recente pesquisa confirma que, no Brasil, o critério cronológico é o único capaz de garantir a justa distribuição e o melhor aproveitamento dos escassos enxertos disponíveis. Deve ser adotado até que se consiga melhorar a captação e, como em outros países, obter enxertos suficientes para transplantar todos (ou quase todos) os inscritos. Esse deve ser o objetivo prioritário para o progresso do setor. Silvano Mário Attilio Raia, 72, professor emérito da Faculdade de Medicina da USP e membro da Academia Nacional de Medicina, é responsável pela Unidade de Fígado. Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Cláudio Weber Abramo: Agora é cumprir Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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