São Paulo, terça-feira, 08 de março de 2005

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CRISE BOLIVIANA

O surpreendente pedido de renúncia do presidente da Bolívia, Carlos Mesa, parece um daqueles clássicos lances de pôquer em que o jogador aumenta a aposta para forçar o adversário a mostrar seu jogo. Os oponentes, no caso, são o líder esquerdista Evo Morales e outros grupos igualmente populistas envolvidos numa série de protestos que está a ponto de paralisar o país.
Pela Constituição boliviana, a renúncia precisa ser aprovada pelo Congresso. Essa excentricidade legislativa permite, no caso de rejeição do pedido, que o presidente conserve o seu posto e eventualmente saia do episódio mais fortalecido. Ao que parece, essa é a estratégia do primeiro mandatário boliviano.
Trata-se, contudo, de um lance arriscado e que, bem-sucedido, pode ter efeitos apenas de curto prazo. Ainda que tudo saia de acordo com os cálculos de Mesa, as razões que vêm fornecendo combustível à crise política boliviana permanecerão.
O presidente Mesa não foi eleito para o cargo e não conta com base partidária própria. Ele era o vice de Gonzalo Sánchez de Lozada, que renunciou em outubro de 2003 após violenta repressão a protestos de rua apoiados por Morales. Embora conte com índices de popularidade de 50% a 60%, Mesa não tem uma identidade política. Trata-se de um jornalista intelectual que se viu elevado à Presidência. Vem adotando posições de bom senso que lhe asseguram a aprovação da classe média, embora, na região de Santa Cruz de la Sierra, a mais rica do país, tenham ocorrido protestos por maior autonomia.
Inicialmente, o líder dos plantadores de coca e seu partido MAS (Movimento ao Socialismo) deram sustentação a Mesa, mas logo ficou claro que a agenda presidencial diferia da do dirigente sindical, que passou a trabalhar para tornar-se o próximo presidente da Bolívia -em 2007, segundo a Constituição, ou já, na hipótese de uma crise de grandes proporções. Resta saber se Mesa, de fato, está blefando, e se o MAS se sente forte o bastante neste momento para insistir no aprofundamento da crise.


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