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CARLOS HEITOR CONY
Velhas e queridas
RIO DE JANEIRO - Outro dia, em Belo Horizonte, quiseram tirar uma foto
minha no escritório de famoso escritor das Gerais. Sentaram-me na poltrona em frente à sua mesa de trabalho, num escritório bacana, com paredes revestidas de nobre madeira,
tapetes orientais, lustres murano e
uma velha máquina de escrever que
servira para desovar pelo menos duas
obras-primas de nossa literatura.
Por Júpiter, que máquina! Nunca
tinha visto uma igual, nem mesmo
na cabine do responsável pela navegação do "Titanic", máquina que
aparece de relance pouco antes de o
navio bater no iceberg.
Com as teclas à mostra, bem no alto, alinhadas como num pente, escondiam praticamente o teclado.
Não sei como aquilo podia funcionar, pois, aparentemente, não havia
espaço para a fita -nem mesmo para o rolo onde o papel pudesse ser colocado. No entanto a geringonça devia funcionar, funcionou realmente,
durante espantosos 22 anos. O escritor nunca mudara de equipamento.
Pulo para o meu caso pessoal. Acredito que tive umas cinco ou seis máquinas um pouco mais modernas do
que aquela, e me espantava com os
avanços de cada uma. Foram todas
aposentadas com a chegada dos computadores. Por inexplicável sentimentalismo, guardei apenas uma delas, na qual escrevera, pálido de espanto como aquele poeta que ouvia
estrelas, o meu primeiro romance.
Impossível fazer isso com os computadores. Em pouquíssimo tempo estou sendo obrigado a mudar de equipamento, quase que anualmente, devido a superação dos modelos. Resultado: não me apeguei a nenhum deles, troco-os como troco de lâmina de
barbear ou de escova de dentes.
Não creio que eles tenham inspirado qualquer tipo de poema a nenhum poeta. Mas lembro um bonito
soneto de Ghiaroni, dedicado à sua
máquina de escrever. Não o sei de
cor. Tuberculoso, terminal, ele pede
que a mãe dele não se assuste quando, em noite de luar, sozinhas, as teclas baterem devagar.
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