São Paulo, quinta-feira, 08 de abril de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Pés no chão

BRASÍLIA - O MST invade uma propriedade produtiva, de uma poderosa multinacional de celulose que acaba de anunciar -no Planalto e ao lado de Lula- investimentos de US$ 1,25 bilhão no país. Eis uma questão que parece dividir o governo ao meio. Ninguém sabe o que fazer.
O lado "à direita" (incluindo ministros do próprio PT), mais realista e pragmático, sabe que o efeito sobre o ânimo dos investidores pode ser terrível. E eles não andam dando sopa.
O lado "à esquerda" (principalmente do PT) dá de ombros: trata-se de um assunto para a Justiça. Afinal de contas, o MST é legítimo e democracias comportam esse tranco.
Desdobrando-se a questão e suas implicações, podemos chegar à seguinte percepção (e isso não significa concordar com ela): a "direita" defendendo os tubarões, e a "esquerda" tentando salvar os "peixes miúdos" -ou seja, a gente que mete a filharada sob lonas pretas e sonha com uma reforma agrária melhor no governo do PT do que no governo do PSDB.
Talvez os dois lados estejam certos, o que implica dizer que talvez ambos estejam errados. Porque, até onde se saiba, isso tudo não é uma guerra, mas uma tática arriscada do MST e que precisa de alguma resposta do governo, não interessa se é do PT. Provavelmente, só complica.
Pelo discurso oficial de antes e de agora, lei é lei, cumpra-se. Mas não há lei neste país, por mais injusto que seja, por mais miseráveis que abrigue, permitindo a invasão de terras produtivas. Ainda mais com direito a destruir o que já estava plantado para improvisar algo novo no lugar.
A invasão das terras da Veracel, portanto, é mais uma questão a pôr em xeque a identidade, os limites, a espinha dorsal do PT no poder. Se acha que deixar pra lá vai ajudar a vender uma imagem de bonzinho e que os investidores vão entender, o governo está errado.
Entre baixar o pau e simplesmente lavar as mãos, há várias opções. O importante é mostrar, lá fora e aqui dentro, que a situação está sob controle. Se é que está.


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