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São Paulo, domingo, 08 de junho de 2003

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UNIVERSIDADE E JUSTIÇA

Pelo critério da justiça social, não há dúvidas de que os mais ricos deveriam pagar para frequentar as universidades públicas. Existe uma distorção de origem. No ensino médio, estudantes pobres se formam na rede oficial, gratuita, que ministra um curso, em geral, de pior qualidade do que aquele oferecido pelas caras escolas particulares. No ensino superior, a situação se inverte. As melhores escolas tendem a ser as públicas. Só que o aluno formado na rede oficial tem maiores dificuldades do que os estudantes de colégios privados para conquistar uma vaga nas universidades públicas. Se esse aluno mais pobre quiser obter formação superior, são grandes as chances de que tenha de arcar com os custos de um curso privado e de qualidade por vezes inferior.
Diante desse quadro, faz sentido pelo menos moral a proposta, agora encampada pelo Ministério da Educação, de exigir algum tipo de compensação financeira dos alunos de universidades públicas que tenham condições de pagar.
É claro que há muitas formas de cobrar. Podem-se exigir mensalidades diretas de quem pode pagá-las ou cobrar, via fisco, do aluno que não dispuser dessa condição depois que ele estiver formado, profissionalmente estabelecido e faturando. Outra idéia interessante é a de exigir dos formandos em universidades públicas que prestem um ano de serviço ao Estado. É a mais republicana das propostas e que ainda traz a vantagem de enriquecer a vida profissional do jovem. O debate sobre a contribuição dos mais ricos à universidade é oportuno. Mas é preciso ampliá-lo para além da questão dos pagamentos.
Antes de mais nada, é bom que fique claro que a cobrança de algum tipo de mensalidade cobriria apenas pequena parte dos custos de uma boa universidade pública. Diferentemente do que muitos imaginam, não são apenas alunos de famílias ricas que frequentam as instituições oficiais. Na verdade, eles são até minoria. Pesquisa realizada no ano 2000 com alunos de federais que prestaram o "provão" mostrou que apenas 5,7% dos universitários tinha renda familiar mensal superior a R$ 7.550; os rendimentos das famílias da grande maioria deles (71,2%) não ultrapassavam os R$ 3.000 mensais.
No mais, as universidades de elite -aquelas capazes não apenas de ensinar mas também de produzir saber- dependem, em qualquer lugar do mundo, de generosas verbas públicas, que são aplicadas a fundo perdido. Ninguém senão o Estado tem condições de investir, por exemplo, bilhões de dólares num acelerador de partículas que trará pouco ou nenhum retorno financeiro. A mesma lógica se aplica a um curso como o de sânscrito, que só pode existir numa universidade pública.
Na verdade, a escolha que se coloca diante do país é entre produzir ciência e renunciar a fazê-lo, contentando-se em consumir tecnologias e idéias importadas. E, para gerar saber, é preciso gastar, isto é, investir em pesquisa e formação de quadros. Em última instância, quem sairá ganhando será o país.



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