São Paulo, sábado, 08 de julho de 2006

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CLÓVIS ROSSI

O presídio e o conversível

PARIS - É impossível evitar a sensação de viver em um país em que o estágio civilizatório é inferior e, pior, regride em certos aspectos com o passar do tempo.
Terminar a leitura sobre o presídio de Araraquara e sobre os atentados contra agentes penitenciários é sair de um mergulho no inferno sem fim.
Ainda por cima, passa ao largo um Mercedes-Benz conversível, para acrescentar humilhação. Fico pensando quanto tempo duraria o casal que ocupa o carro se ousasse cometer esse crime imperdoável nas ruas de São Paulo ou do Rio.
Do que seria privado: do carro, dos relógios, dos celulares, das carteiras, das cabeças? Pior: aqui, ninguém olha. Deve ser normal andar de carro conversível. Que gente estranha.
Não, não quero dizer que a França seja modelo de convivência. Nenhum país o é, aliás. Aqui também, e recentemente, durante as comemorações da vitória sobre o Brasil e depois sobre Portugal, houve ataques a agentes policiais por parte de jovens. Sem maiores conseqüências, mas houve.
A grande diferença é o que acontece depois (ou durante): só na madrugada de quinta-feira, depois do jogo com Portugal, 189 pessoas foram detidas, por diferentes distúrbios, que vão das agressões à embriaguez. E em São Paulo?
Esse é o ponto central: por aqui, está combinado que quem quer cometer um delito é obrigado a ter medo da polícia. No Brasil, inverteu-se a regra do jogo: a polícia é que tem medo.
Aqui também, onde a polícia tem medo de ir (em certas áreas das "banlieues", os subúrbios das grandes cidades), instala-se a barbárie. É inevitável. A diferença é que o sistema ainda não gangrenou. No Brasil, apodreceu não apenas a relação polícia/criminoso mas o sistema prisional. É o horror.


crossi@uol.com.br

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