São Paulo, domingo, 08 de setembro de 2002

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EDITORIAIS

A BOLHA AMERICANA

Aconteceu primeiro com o Japão e, mais recentemente, ganham intensidade os temores de que venha a ocorrer também nos Estados Unidos. Nem catástrofe nem superação da crise financeira, o que pode estar em curso é um longo período de crescimento econômico muito baixo, insensível às medidas de política econômica.
As evidências são a cada dia mais preocupantes. A maior economia do planeta cresceu em excesso, movida pela especulação financeira.
Um ajuste muito rápido e intenso produziria uma crise de proporções inéditas. É portanto um ótimo sinal que isso não ocorra agora.
A alternativa que se cristaliza, no entanto, deixa pouco espaço para visões otimistas. O ajuste depois da exuberância, algo irreversível, ocorre lentamente. Como houve muitos excessos, o tempo necessário para essa cura mais lenta é inevitavelmente longo, com altos e baixos.
Houve nos EUA excesso de endividamento, de famílias e de empresas com relação à riqueza nacional. Houve excesso de valorização de ações nas Bolsas de Valores. Finalmente, teria havido excesso de investimento em capacidade produtiva.
Desde o momento de auge de valorização da Nasdaq (Bolsa que concentra as ações de empresas de alta tecnologia), em março de 2000, as perdas acumuladas pelos investidores passam de US$ 7 trilhões.
O efeito depressivo sobre o ânimo de empresários e banqueiros é evidente, criando um círculo vicioso em que a aversão ao risco deprime ainda mais os mercados financeiros. As irregularidades na contabilidade de algumas das principais corporações norte-americanas tornam o cenário ainda mais preocupante.
O Japão, que também evitou uma crise mais violenta de sua economia, patina há mais de uma década num processo semelhante de saneamento dos excessos da especulação financeira. A purgação dos balanços bancários prossegue.
Na União Européia, os indicadores de fragilidade também ganham peso, em especial na economia alemã, seu principal centro industrial.
A fragilidade dos EUA produz um dólar fraco diante do euro, tornando ainda mais difícil o mercado para as exportações européias.
Japão e UE, no entanto, desempenham papel secundário no desenho dos rumos da economia mundial. Os dois sistemas são relativamente mais fechados se comparados às oportunidades criadas nos mercados norte-americanos às exportações de todo o mundo.
A desaceleração nos EUA, portanto, pesa mais no quadro global que as oscilações dos mercados europeus e asiáticos. Esses, aliás, dependem muito do consumidor e do empresário norte-americano. São portanto inevitavelmente contagiados pela desinflação da bolha americana.
É cedo para dizer que os EUA ou mesmo o sistema global rumam para uma depressão. O consumidor norte-americano, que responde por dois terços do PIB do país, ainda vai às compras, animado pelos juros baixos e pelas promoções.
Quase tão preocupante quanto uma recessão, no entanto, é a hipótese de uma longa era de crescimento baixo, em que os EUA e a UE sigam o roteiro que hoje sacrifica os órfãos da bolha especulativa japonesa.


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