São Paulo, terça-feira, 08 de novembro de 2005

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REVOLTA NA FRANÇA

A rebelião de jovens suburbanos que há 12 dias dilacera a França constitui o mais sério desafio à autoridade do Estado desde os protestos estudantis de 1968. Os distúrbios, que começaram nas vizinhanças da empobrecida Clichy-sous-Bois e rapidamente se espalharam por toda a periferia de Paris, agora ganharam a capital francesa e praticamente todas as grandes cidades do país. Já se registraram incidentes na Bélgica e na Alemanha, e outras nações européias temem o contágio. Não se pode descartar um cenário de protestos generalizados por toda a Europa ocidental.
Como sempre ocorre em rebeliões sem líderes, é difícil traduzir em exigências concretas as demandas dos sublevados. É certo que os jovens, em sua maioria franceses descendentes de imigrantes do norte da África, exigem a melhoria das condições econômicas em que vivem. Esse parece ser um ingrediente necessário para a revolta, porém insuficiente para explicá-la. Afinal, embora ocupem a base da escala social francesa, vivem nas condições relativamente boas proporcionadas pelo "welfare state" local. Têm direito a educação e saúde gratuitas, salário-desemprego e outras formas de amparo.
Sentem-se, entretanto, injustiçados e reclamam igualdade de oportunidades. Com efeito, as periferias tornaram-se verdadeiros guetos étnicos, dos quais são pequenas as chances de um jovem sair. Ficam, assim, desesperançados, o que tende a ser um excelente motor para revoltas.
Essa situação vem sendo agravada por uma crescente intolerância da França "oficial" para com a França islâmica dos subúrbios -e vice-versa. Desde o 11 de Setembro, aumentaram a desconfiança e a repressão -e o veto ao uso do "hijab" (véu islâmico) na escola pública foi simbólico quanto a isso. Seria fácil justificar a revolta "vitimizando" os filhos de imigrantes e culpando os europeus, mas as perspectivas de convivência pacífica entre esses dois mundos envolvem questões bastante complexas e constituem um dos grandes desafios do mundo contemporâneo.


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