São Paulo, domingo, 09 de julho de 2006

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CLÓVIS ROSSI

Dores, nossas e deles

PARIS - O velho sábio que habita a Folha costuma usar uma expressão cujo espírito é o seguinte (embora a letra possa ser levemente diferente): "Quem vê meus risos não vê minhas lágrimas".
A França, para a geração colonizada culturalmente pela Europa, não pelos Estados Unidos, como é o caso da minha, parecia só ter risos. Segunda potência econômica da Europa, atrás da Alemanha, um sistema de bem-estar social formidável (em crise, mas formidável mesmo assim, particularmente visto da América Latina) e um peso cultural ainda importante.
Agora, as lágrimas. O presidente Jacques Chirac (conservador para os padrões franceses, de extrema-esquerda se transplantado para o Brasil) cunhou uma expressão ("declinologues" ou "pregadores do declínio") que é, em francês, a mesma a rigor usada no Brasil por Fernando Henrique Cardoso ("fracassomaníacos") e continuada por Lula ("há os que torcem para tudo dar errado").
De alguma forma, o ponto de partida desses neologismos ou frases de efeito é parecido, guardadas as devidas proporções entre um país com a vida ganha, como a França, e outro, como o Brasil, com tudo praticamente por fazer. A França viveu seus anos dourados no pós-guerra. De 1945 a 75, a renda real per capita simplesmente quadruplicou. No cotidiano, as oito horas necessárias para comprar um quilo de frango, em 1946, viraram meros 45 minutos, 30 anos depois.
A seguir, estancou. Um pouco como o Brasil, que teve a era do mal chamado "milagre econômico" durante uma fase da ditadura, para depois patinar. Um último paralelo: na hora em que os Chiracs, FHCs e Lulas deixarem de usar óculos panglossianos quando estão no poder, talvez seja o primeiro passo para começar a ajeitar as coisas, cá como lá.


crossi@uol.com.br

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