São Paulo, terça, 9 de setembro de 1997.



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FACHADA PARA A JOGATINA

Entidades filantrópicas estão sendo usadas como pretexto para legalizar o esquema de jogo na TV por intermédio do serviço telefônico 0900. Neste ano, esse esquema já movimentou mais de R$ 119 milhões. Reportagem de Elvira Lobato publicada ontem por esta Folha revelou que as entidades filantrópicas, que por lei deveriam ser as beneficiárias dos sorteios, são as que menos ganham com eles. Têm ficado, em média, com apenas 5% da arrecadação.
Os números mostram que a operação, além de estimular o vício do jogo, inclusive entre menores de idade, o que é proibido, tem-se caracterizado por um grave desvirtuamento das finalidades previstas por lei.
Estranhamente, o diretor do Departamento de Proteção ao Consumidor do Ministério da Justiça, Nelson Lins, responsável pela aprovação dos sorteios, diz que "algumas instituições podem estar recebendo pouco, em função de o sorteio não ter tido sucesso. Outras recebem bastante. O que nos interessa é o cumprimento da legislação e a lisura do sorteio".
Ora, há sérias dúvidas quanto ao cumprimento da legislação. Portaria do Ministério da Justiça determina que as entidades filantrópicas só podem sortear um bem que lhes tenha sido doado. Quem "doa" esse bens são, na quase totalidade dos casos, as próprias emissoras ou as empresas interessadas, que depois lançam o valor do produto como despesa da operação.
Os números também indicam que não tem havido relação direta entre o "sucesso" de um sorteio e o dinheiro destinado às entidades filantrópicas. Num deles, realizado pelo programa Ana Maria Braga, da Record, a arrecadação bruta foi de mais de R$ 950 mil. A Associação dos Autistas, em nome da qual se realizou o sorteio, recebeu apenas R$ 10.040,00 -pouco mais que 1%.
O mais grave é que esse esquema, consentido pelo governo e estimulado por uma publicidade ostensiva, vem deixando de beneficiar devidamente entidades que cuidam de deficientes físicos e pessoas carentes. É preciso dar um basta a esse verdadeiro escárnio que se apresenta sob o véu hipócrita das boas intenções.





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