São Paulo, terça-feira, 10 de janeiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELIANE CANTANHÊDE

Luto

BRASÍLIA - O Exército, encampado pelo vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar, tem resistido o quanto pode à versão de que o general Urano Bacellar se suicidou com um tiro na boca em pleno comando da missão de paz no Haiti.
É verdade que mortes em geral, e essa muito especialmente, têm de ser apuradas ao máximo até não haver nenhuma sombra de dúvida. Mas tudo indicou, desde o início, que se tratava de suicídio.
Contra fatos e contra laudos internacionais detalhados não há argumento, e o que se pode deduzir é que não é aceitável para as Forças Armadas que oficiais generais se matem nem sintam suas "dores de alma".
Pode acontecer em qualquer região do mundo, em qualquer profissão, em qualquer família, mas, para o Exército, foi um golpe duríssimo. Generais se matando não é algo comum, muito menos num comando com exposição internacional.
É como se algo tivesse quebrado, porque um general é treinado para missões árduas, situações adversas de toda ordem, distância da família, isolamento, pressão e, afinal, bombardeios e mortes. São duros, frios, profissionais. Mas, antes de ser um oficial afável e prestigiado entre os colegas, o general era uma pessoa. Ponto.
Essa tragédia, que é mais pessoal do que qualquer outra coisa, se transformou numa questão diplomática e política: chamou a atenção internacional para a situação dramática e crônica do Haiti e revolveu as intensas discussões sobre a oportunidade ou não de o Brasil se aventurar num comando de tropa num país que nem português fala.
O Brasil aproveita para cobrar mais dinheiro e mais apoio no Haiti, como o chanceler Amorim deverá fazer hoje com o enviado especial da Casa Branca Thomas Shannon.
Bacellar, cujo corpo deve chegar hoje e ser enterrado amanhã, pode, sem querer, ter feito mais pelo Haiti morto do que poderia fazer vivo. O Exército não precisa se envergonhar. Pessoas são pessoas, de farda ou não.


@ - elianec@uol.com.br

Texto Anterior: São Paulo - Vinicius Torres Freire: Alckmin no páreo
Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: É a guerra!
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.