São Paulo, terça-feira, 10 de fevereiro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Transparência e responsabilidade fiscal

LUÍS INÁCIO LUCENA ADAMS

Muito tem sido debatido nas últimas semanas acerca do projeto de lei nº 2.546, de iniciativa do Poder Executivo, em tramitação na Câmara dos Deputados, que trata da regulamentação das Parcerias Público-Privadas (PPP). Argumenta-se que a proposta do governo federal é prejudicial ao interesse público por ferir a responsabilidade fiscal e facilitar o dirigismo nos processos de concorrência pública. Nada mais longe da verdade.
O projeto de lei das Parcerias Público-Privadas prevê, em diversos artigos, o respeito obrigatório ao que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A sua aplicação é reforçada, por exemplo, ao estabelecer a responsabilidade fiscal como diretriz a ser observada na celebração e execução das parcerias (art. 2º, inciso 1, do projeto); ao estender para os contratos as exigências e as condições específicas existentes para realizar despesas de caráter continuado da administração pública (art. 14); e ao determinar a observância das regras da LRF na concessão de garantias financeiras pela União (art. 6º).


O projeto de lei das PPPs prevê o respeito obrigatório ao que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal


É importante destacar que o projeto de lei vai além da exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, pois obriga que a estimativa de compatibilidade alcance todo o período de vigência do contrato de parceria, e não apenas três anos. A preocupação do governo federal com o adequado enquadramento orçamentário-financeiro do gasto público é reforçada com o fato de que a carteira de potenciais projetos de parceria apresentada pelo ministro do Planejamento já está incorporada ao projeto de lei do Plano Plurianual, em tramitação no Congresso Nacional.
É errôneo afirmar, igualmente, que o projeto afasta a aplicação da Lei de Licitações e das leis de concessões públicas. Primeiro, porque as mesmas, por expressa previsão do art. 17 do projeto, regulam os procedimentos para a contratação de Parcerias Público-Privadas. Segundo, porque o projeto adota como obrigatória, tal qual a Lei de Concessões Públicas, a modalidade mais rígida da concorrência, prevista na Lei de Licitações. Esse procedimento aponta maior transparência na contratação, seja por exigir ampla divulgação de seus atos mediante a devida publicação, seja por garantir aos licitantes maiores condições de impugnação dos atos praticados no curso da licitação.
Além disso, a idéia que envolve a possibilidade de ocorrerem novas e sucessivas propostas de preço até a proclamação do resultado final não é nenhuma novidade no Brasil. Simplesmente incorpora o procedimento de realização de lances já existente nos contratos feitos mediante a modalidade de licitação denominada pregão (lei 10.520, de 2002), já praticados nos grandes processos de privatização ocorridos no passado no setor elétrico, de telecomunicações, de siderurgia e financeiro, com evidentes ganhos para a administração pública em relação aos preços iniciais.
Igualmente, o aperfeiçoamento de propostas no curso do processo de licitação é prática existente em diversos países, que permite, principalmente em projetos de maior impacto econômico e social, a incorporação de diferentes técnicas capazes de reduzir o seu custo final -em favor da administração pública e, no final, do contribuinte. Esses melhoramentos deverão ocorrer apenas no projeto executivo, já que é obrigatório que a administração tenha um projeto básico para poder iniciar a licitação -decorrência lógica da aplicação obrigatória do que dispõe a Lei de Licitações, nos termos do art. 17 do projeto.
Infelizmente, as análises produzidas até o momento baseiam-se na leitura descontextualizada de dispositivos do projeto de lei ou de parte deles, dando aos mesmos um alcance que não têm. Ele foi elaborado não para romper com a sistemática das licitações, mas para estabelecer algumas especificidades próprias aos contratos de parceria, considerando que a responsabilidade integral pelo investimento de interesse público é do parceiro privado. Esse é o elemento de distinção fundamental na PPP, constantemente esquecido nas análises feitas, e é a razão pela qual devem ser dadas garantias pela administração pública de que, no período de 30 anos em que vigorar o contrato, honrará com seus compromissos.
O histórico da elaboração do projeto, além disso, demonstra a busca de transparência e respeito ao interesse público. Ele foi redigido e aperfeiçoado na discussão havida não só dentro do governo, mas com diversos setores sociais e econômicos; analisado pelos integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômicos e Social e posto em consulta pública, antes de ser encaminhado ao Congresso Nacional.
Por todas essas razões, a aprovação do projeto que regulamenta as Parcerias Público-Privadas representa um passo importante para atingir maior eficiência na execução dos serviços públicos, impulsionando o crescimento econômico do Brasil.

Luís Inácio Lucena Adams, 38, procurador da Fazenda Nacional, é consultor jurídico do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.


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