UOL




São Paulo, segunda-feira, 10 de março de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CARLOS HEITOR CONY

O poder do poder

RIO DE JANEIRO - Os Estados Unidos deram dez dias ao Iraque para se desarmar. Foi o máximo de contemporização que o governo de Washington concedeu à opinião pública mundial e, em especial, aos apelos da França, Alemanha e Rússia. Findo o prazo, a colossal máquina de guerra norte-americana, acolitada pela inglesa, entrará em atividade.
Tecnicamente, os entendidos chamam a isso de "ultimato". Na realidade, não é um ultimato, ou seja, o prazo que uma das duas vontades contrárias dá à outra antes de iniciar um confronto.
No caso, a desproporção militar e econômica entre os contendores anula o conceito de "confronto". Os dez dias dados a Saddam para se alinhar à vontade do desafiante cheiram mais a chantagem. O Iraque terá dez dias para decidir se paga ou não o preço exigido pelo adversário que tem em seu poder o poder de destruí-lo, física e moralmente.
Numa guerra normal (se é que as guerras podem ser consideradas normais), um dos elementos-chave é o fator surpresa. Para dar um exemplo recente: a invasão da Normandia pelos aliados, em 1944, só foi possível porque os alemães imaginaram até a última hora que o desembarque das tropas inimigas seria em Calais e em data não sabida.
Quando um dos contendores tem a certeza de que o adversário não tem como reagir (e essa é a essência de qualquer chantagem), não há necessidade de ultimato. O mais forte, que tem em seu poder o poder de destruir o mais fraco, marca um prazo, um preço e um local para que a conta seja paga. Caso contrário, o recalcitrante aguentará as consequências.
O poderio militar da aliança Estados Unidos e Inglaterra, com o apoio comprado de outros países, possivelmente até o da Turquia, caracteriza um massacre, não uma guerra. É uma chantagem enfim, e não um ultimato.


Texto Anterior: Brasília - Valdo Cruz: Descompasso
Próximo Texto: Boris Fausto: Limites e realidades do poder
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.