São Paulo, terça-feira, 10 de agosto de 2004

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CLÓVIS ROSSI

O exílio está de volta

SÃO PAULO - Nada mais eloqüente (e assustador) sobre a perda de capacidade de reação da sociedade brasileira do que o silencioso retorno do exílio às práticas da pátria.
É um caso, que se saiba, mas nem por isso deveria deixar de causar furor, indignação, gritaria, revolta. Refiro-me à família da estudante que ficou 70 dias seqüestrada e, no momento seguinte à libertação, partiu para o exílio em Miami.
Pelo pouco que se sabe do perfil do pai, trata-se exatamente do tipo de pessoa que sucessivos governos vêm elogiando como modelo para a pátria. Tornou-se tão competitivo que tem ramos de sua empresa em três pontos externos, o que, de resto, facilitou sua ida para o exílio.
É, portanto, o clássico caso de brasileiro que globalizou-se com êxito. O que ganhou do poder público em troca? O exílio.
Pior: o exílio começa sob a mais completa indiferença da sociedade, como se fosse normal que pessoas que nada devem aos agentes da lei fujam do país por temor à perseguição dos fora-da-lei.
É bom não esquecer que, embora o caso dessa família seja mais claramente identificável como de exílio, há inúmeros outros, até mais trágicos: são os brasileiros que, perdida a esperança de vida decente na pátria, buscam entrar clandestinamente nos Estados Unidos.
Para alguns deles, como esteve recentemente no noticiário desta Folha, a volta do exílio se dá dentro de um caixão, justamente o destino de que fugiu a família da estudante.
Em qualquer país minimamente decente, as autoridades (ou ao menos uma autoridade) se teriam mobilizado para: 1 - Prestar contas ao público; 2) Iniciar uma ação vigorosa e de emergência que impeça novos exílios, quaisquer que sejam os motivos.
No Brasil, faz-se o mais denso e assustador silêncio.


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