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TENDÊNCIAS/DEBATES
Wall Street e o futuro do Brasil
ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA
Quando executivo do Banco de
Investimentos do Brasil, durante
os anos 60 e 70, tinha como rotina ir periodicamente aos EUA e Europa, visitando suas principais praças financeiras
para promover investimentos no Brasil.
Nessas visitas cabia a mim, quase
sempre, falar do mercado de capitais e
das perspectivas das Bolsas no Brasil.
Numa dessas apresentações, no ocaso
do regime autoritário, mostrei com
muito entusiasmo que os sinais de abertura política eram evidentes e que uma
nova era de democracia podia ser vislumbrada para o futuro do Brasil. Não
senti por parte do auditório uma receptividade à altura do meu otimismo. Depois da apresentação, um dos presentes
me procurou para externar sua preocupação com a abertura e me perguntou
se os brasileiros estavam preparados
para votar. A manutenção do status quo
autoritário não lhes era desconfortável.
Passaram-se alguns anos, e eu gostaria muito de reencontrar esse preocupado analista e comentar os resultados das
eleições de 6 de outubro. De lá para cá o
mundo mudou, e nossa democracia se
consolidou. Quem sabe aqueles mesmos analistas do passado, reticentes a
respeito dos prospectos de uma abertura, se surpreendessem com os números
que acabamos de registrar. Para um observador externo isento, não devem ter
passado despercebidos alguns fatos.
A derrota de figuras tradicionais da
política brasileira indica que os eleitores
favorecem a renovação. Cinco ex-governadores fracassaram na tentativa de
eleição, assim como um ex-presidente.
O Congresso teve composição alterada,
com aproximadamente a metade de novos membros, o que pode favorecer a
aprovação de importantes reformas.
A ascensão do PT em todo o país,
marcando forte presença na composição do novo Congresso. Essa votação sinaliza o desejo de mudanças da grande
maioria dos eleitores, o que é evidente
também por outros indicadores.
Malgrado a demora em algumas seções e a complexidade de uma eleição
com seis opções de voto, o Brasil deu
uma clara demonstração de sua capacitação para conduzir um processo eleitoral de tal magnitude. Em 48 horas os resultados estavam disponíveis, sendo
praticamente eliminada a possibilidade
de fraudes.
Nunca uma eleição no Brasil ocupou
tanto espaço na imprensa mundial. Isso
demonstra claramente a importância
dos desdobramentos políticos do nosso
país para a economia mundial e, particularmente, para a nossa região.
No Congresso, mais do que nunca a
busca de coligações será fundamental.
Tenho viajado com frequência, e durante o período pré-eleitoral não foram
poucas as vezes em que defendi que a alternância de poder é parte do jogo democrático e que a sociedade brasileira
dava claras demonstrações de ter amadurecido o suficiente para considerar tal
hipótese. Não interpreto esse novo
mandato como ruptura nem como a
prevalência de soluções heterodoxas.
Surpreendeu-me a impaciência de Wall Street com a necessidade de termos um segundo turno
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Consultando minhas anotações, lembrei-me de que mesmo numa boa fase
do governo de Fernando Henrique, e
num mundo menos conturbado, quando já se falava em sucessão, em 2000,
numa palestra em Nova York, chamei
atenção para a necessidade de "desdemonizar" a idéia de que a ascensão de
Lula e do PT ao poder significaria uma
forte ruptura no sistema econômico.
As mudanças ocorridas recentemente
na postura do candidato e do seu partido parecem confirmar claramente essa
posição. Aliás, os europeus sempre se
mostraram menos preocupados com
eventuais mudanças na área política do
que nossos vizinhos do Norte.
Também com frequência, no exterior,
sou obrigado a dissociar a eventual vitória do candidato do PT, ou mesmo do
Serra, de uma situação parecida com a
de qualquer outro país da América Latina. Apesar de alguns problemas em comum, nossas semelhanças são escassas.
Nossos estágios de desenvolvimento
são bem distintos, portanto comparar
lideranças políticas de outros países
com as nossas é demostrar um grande
desconhecimento da nossa realidade. É
evidente que a recíproca não é verdadeira, pois os resultados da eleição brasileira terão impacto nos próximos pleitos
de Argentina, Equador e Paraguai.
Por último, surpreendeu-me a impaciência de Wall Street com a necessidade de termos um segundo turno. Que
autoridade têm os analistas de mercado
do outro lado do equador para avaliar o
que melhor interessa ao futuro do nosso
país? O segundo turno consolida o processo democrático e nos fornece elementos mais sólidos para escolhermos
aquele que entendemos estar melhor
preparado para enfrentar os grandes
desafios que temos pela frente.
Esses desafios não são poucos nem fáceis, porém perfeitamente administráveis. Para tanto, a governabilidade será
um fator da maior importância.
É evidente que a compreensão externa e o apoio dos investidores será fundamental. Sem posições pré-concebidas ou enviesadas, respeitando a realidade do nosso país.
Roberto Teixeira da Costa, 68, economista,
fundador e vice-presidente do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), é membro do
Conselho de Administração do Banco Itaú. Foi
presidente do Conselho de Empresários da América Latina (1998-2000).
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