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FERNANDO RODRIGUES
A favela, os garçons e Lula
TERESINA - Quando ocorre um ato falho, já disse Freud, o indivíduo se
revela por inteiro. Fala algo que normalmente não gostaria de dizer se
pensasse duas vezes.
Luiz Inácio Lula da Silva protagonizou vários atos falhos ontem, aqui
em Teresina, capital do Piauí. Ao
apresentar alguns de seus ministros
para os miseráveis da Vila Irmã Dulce, discursava como se ainda fosse
candidato ou presidente eleito.
Humberto Costa "vai ser ministro
da Saúde", disse o presidente. Corrigiu-se em seguida: "Não vai ser, não.
Já é. Porque nós ganhamos a eleição e
já tomamos posse". Outros ministros
foram alvos do mesmo ato falho de
Lula. Freud explica. Era mais fácil ser
oposição do que situação.
A simbólica e marqueteira viagem
à miséria não serviu apenas para Lula mostrar a seus ministros como é o
Brasil profundo.
O presidente também começou a
desfrutar da beleza que é a distância
abissal entre o poder e os pobres
-para quem está no poder, é claro.
Exemplo: os garçons vestidos de ternos brancos e gravata borboleta servindo água gelada para os ministros
e Lula. Na praça de chão de terra batida, piauienses desmaiavam de calor. Havia apenas seis banheiros improvisados para 7.000 pessoas.
Seria demagogia exigir que o presidente da República não tivesse água
gelada à disposição. Mas garçons engravatados no meio da favela? Imagine o leitor se o protagonista do comício fosse FHC.
Não é tudo. A favela foi isolada.
Cordões por todos os lados. Os favelados só entravam depois de se submeterem a um dos quatro detetores de
metais instalados no local.
É possível que Lula fizesse tudo diferente se tivesse sido avisado sobre os
sinais exteriores do abismo social
brasileiro que estavam montando
para ele. Esse é o ponto. O presidente
logo verá que não vai opinar sobre
muita coisa. Terá de confiar em assessores. Verá então como é difícil ser
governo de verdade.
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