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CARLOS HEITOR CONY
Sapatos e gravatas
RIO DE JANEIRO - O mais recente ministro da Educação, como todos os
que chegam ao poder, promete mais
uma reforma no ensino, reforma que
está sendo feita desde que Anchieta e
Nóbrega começaram a catequizar os
nossos índios.
Um cidadão comum com mais de
50 anos atravessou diversas dessas reformas, daí que encontramos pessoas
deslocadas de sua vocação, porque,
em determinada época, não tiveram
condições de superar as cascas de banana (técnicas ou financeiras) que o
ensino oficial colocava no caminho
dos pretendentes aos estudos superiores.
O latim tirou o tesão de muitos candidatos à advocacia, a matemática
mudou a vida de pessoas que gostariam de ser médicos -e fico em dois
exemplos apenas, atrevendo-me a
mais um, de ordem pessoal.
Se fosse hoje prestar um exame de
admissão, com as novas regras gramaticais e ortográficas e os conceitos
de sintaxe, eu não teria passado -o
que não chega a ser uma revelação,
os possíveis leitores já descobriram isso há bastante tempo.
Mudam não apenas a filosofia da
educação mas o conteúdo, a matéria
de ensino em si. Nunca entendi a
classificação de ciência exata. Todas
elas, mesmo a física e a própria matemática, não chegaram nunca a ser
exatas. Volta e meia levam um esbarrão e tudo fica fora de foco. A equação de Einstein, que derrubou o universo de Newton, está sendo contestada por um jovem português já em nível acadêmico. No terreno das ciências ditas humanas (todas não deixam de ser humanas, uma vez que
fabricadas e utilizadas pelo homem),
elas estão sempre em processo.
Para acompanhar a dinâmica das
ciências exatas ou humanas, é necessário um ponto de observação fixo,
um critério objetivo de busca e pesquisa, que é a matéria em si do ensino. Mudar essa matéria, reformando-a de tempos em tempos, é tornar
relativa a educação, como o tamanho do salto de um sapato para a
mulher ou a largura de uma gravata
para o homem.
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