São Paulo, quarta-feira, 11 de abril de 2001

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Pela correção da tabela

LUIZ MARINHO


Um casal argentino, com um filho e R$ 3.000 ao mês, é isento de IR; um casal semelhante no Brasil paga R$ 2.000 ao ano
A cada ano, quando chega a hora de prestar contas ao leão, a polêmica sobre o congelamento da tabela do Imposto de Renda volta à discussão. Essa tabela não é corrigida há cinco anos. Entre nós, metalúrgicos do ABC, isso significa que o imposto médio pago por cada trabalhador subiu de R$ 892,87, em 1995, para R$ 2.595,93, em 2000 (um crescimento de 190,7%).
Os números desse estudo (Dieese) sobre a nossa categoria -na qual, todos os meses, 40% dos trabalhadores recolhem IR na fonte- são assustadores. E revoltantes, quando comparados com dados da pesquisa da Ernest & Young sobre tributação internacional. Eles mostram que, em países como o Uruguai e o Paraguai, os trabalhadores assalariados não são nem obrigados a fazer a declaração anual de renda.
Com a Argentina, o comparativo continua escandaloso. Um casal argentino com um filho e ganhando R$ 3.000 por mês consegue isenção de Imposto de Renda. Um brasileiro nas mesmas condições paga cerca de R$ 2.000 por ano -um norte-americano, apenas R$ 658.
O problema do congelamento da tabela do IR só agrava esse quadro. Há três meses, ao cobrar isso do presidente FHC, ele me recomendou ir ao secretário da Receita, Everardo Maciel, para arrancar dele a decisão a respeito da correção da tabela. Nenhum sucesso.
As declarações anuais estão sendo entregues e a tabela continua a mesma. Não sei se o secretário manda mais do que o presidente, mas o fato é que a recomendação não valeu nem sequer para provocar uma resposta -um gesto mínimo de civilidade- a um pedido formal de audiência.
Nos últimos dias surgiram sinais de movimento pró-correção da tabela dentro da base aliada de FHC no Congresso. Também apareceram declarações contrárias da Receita Federal. Como entender esses sinais? Com a necessária desconfiança, naturalmente.
O conflito aparente pode estar escondendo a intenção de tentar uma saída para evitar que a Justiça volte a condenar o governo, como fez em relação aos saldos do FGTS. Há várias demandas judiciais pedindo a correção da tabela e dificilmente os tribunais deixarão de reconhecer como ilegal essa forma camuflada de aumentar os impostos.
A saída, então, seria entregar os anéis para não perder os dedos, ou seja, propor a correção da tabela num patamar bem inferior à variação da inflação no período. Segundo o IBGE, o INPC do período registra uma variação de 62,5%. Daí porque é no mínimo suspeito ouvir, de fontes ligadas à base política e sindical do governo FHC, sugestões de correção de cerca de 30%.
O congelamento da tabela foi, na verdade, um recurso do governo para diminuir o impacto da redução de arrecadação por conta da queda da atividade econômica registrada nos últimos anos. O reaquecimento atual poderia dar fôlego à equipe econômica para algum reajuste na tabela, sem prejuízo de arrecadação. É uma lógica de um governo fraco, incapaz de pensar numa reforma tributária que consiga restabelecer um mínimo de justiça fiscal neste país.
Quem ganha mais tem de pagar mais impostos. Mas o governo FHC prefere aumentar impostos -como acaba de fazer ao elevar a alíquota da CPMF para 0,38%, o que vai significar mais R$ 15 bilhões no ano, ou seja, quase 10% de tudo o que a Federação arrecada.
Mas não adianta ficarmos responsabilizando apenas o governo FHC por esse descalabro fiscal. O Congresso também tem a sua responsabilidade.
Há propostas de reforma tributária e até mesmo projetos específicos sobre a correção da tabela do IR -como o do deputado Ricardo Berzoini (PT-SP)- que vivem nas gavetas do Congresso. Há até um projeto do senador Paulo Hartung (PPS-ES) já aprovado no Senado. Falta a Câmara discutir o assunto.
Pelo ritmo da carruagem, no entanto, parece que vai ser preciso esperar pela renovação do Parlamento e do governo em 2002 para que o Brasil possa ter um mínimo de justiça tributária.
Vamos trabalhar para isso.


Luiz Marinho, 41, é presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, e coordenador do Mova (Movimento de Alfabetização) Regional ABC.




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