São Paulo, quinta-feira, 11 de julho de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Presidente piora sociólogo

SÃO PAULO - À medida que seu mandato se aproxima do fim, o presidente Fernando Henrique Cardoso se torna um sociólogo pior.
Sua frase de anteontem sobre a pobreza, pronunciada na Associação Comercial do Rio de Janeiro, é a prova mais contundente. Disse o presidente que a estabilidade (de preços) trazida pelo Plano Real mudou a maneira de ver a pobreza.
"Vivemos como se a desigualdade tivesse sido descoberta agora. O que acontece é que, sem inflação, com mais democracia e liberdade, a desigualdade passou a ser intolerável."
Perdão, presidente, mas o senhor mesmo é a prova viva do contrário. Em 1975, durante a ditadura e durante o período inflacionário (não tão feroz, mas inflação de todo modo), o senhor participou de um livro chamado "São Paulo - Crescimento e Pobreza".
Editado pela igreja comandada por dom Paulo Evaristo Arns, era um grito de alerta sobre a pobreza e a desigualdade em uma São Paulo um pouco mais habitável do que a de hoje, pelo menos para o cidadão comum (para os engajados politicamente, era o inferno, sim).
Portanto achar que o Plano Real provocou a descoberta da pobreza é, definitivamente, esquecer o que o senhor mesmo escreveu.
Sem contar o fato de que os oposicionistas ao regime militar sempre o atacaram não só pela violência institucional que todo arbítrio representa mas também por, suposta ou realmente, fazer aumentar as desigualdades. Portanto não foi preciso redemocratizar o país para descobrir a "intolerável" desigualdade.
O que é de fato "intolerável" é a permanência de níveis obscenos de desigualdade mesmo depois de o senhor ter prometido, no discurso da primeira posse, enfrentá-la como prioridade um.


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