São Paulo, Sábado, 11 de Setembro de 1999
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O poder, e depois

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Gilberto Dimenstein voltou ontem de Brasília. Cruzou no aeroporto com Clóvis Carvalho, o ex-ministro do Desenvolvimento. Foi patético, relata Gilberto.
O cidadão que, ao menos no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, era tido e tratado como primeiro-ministro estava absolutamente só. Sem assessores, aspones, bajuladores, obrigado a carregar a própria mala. Nem sequer encontrou interlocutores, exceto um ou dois passageiros, com os quais foi obrigado a compartilhar a fila dos mortais comuns.
É um precioso instantâneo do poder e, acima de tudo, deveria servir de lição de vida para os poderosos de hoje, tão cheios de si, tão seguros de que serão poderosos para todo o sempre. É infinitamente pequena a distância entre as pompas do poder e o despencar no absoluto anonimato.
O problema é que 99% dos poderosos só descobrem essa elementar realidade quando é vítima dela. Antes, comportam-se como Clóvis Carvalho em suas viagens de carona em aviões da FAB para a ilha de Fernando de Noronha.
Apanhados em flagrante, primeiro pagam por uma das muitas viagens, mas, depois, dão uma solene banana para o respeito a códigos mínimos de conduta e demonstram até orgulho de se comportarem como cidadãos acima dos demais.
Talvez uma boa maneira de educar devidamente o homem público fosse submetê-lo, durante e não depois de deixar o cargo, a cenas como as enfrentadas pelo agora destronado Clóvis Carvalho. Ou seja, fazê-lo passar pelas dificuldades (e olhe que fila de embarque não chega a ser o maior dos tormentos do Brasil) que os cidadãos comuns enfrentam todo santo dia.
Alguns talvez não sobrevivessem à experiência. Mas os que conseguissem seriam com certeza um pouco mais humildes no gozo das pompas do poder. Com um pouco de sorte, seriam também mais sensíveis às dificuldades dos governados.


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