São Paulo, Sábado, 11 de Setembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Sigaud, Hélder e Marcelo

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA

Brasília - A morte recente de dom Geraldo Sigaud e dom Hélder Câmara remete para um tempo em que a ação social da Igreja Católica no Brasil era marcada por traços tão distintos dos atuais que parece ter ele ocorrido há muito mais do que meros 40 anos.
No início da década de 60, a igreja se dividia entre conservadores e progressistas, alguns, como dom Sigaud e seu arquiinimigo dom Pedro Cassaldáliga, extremados. Outros, como dom Hélder, embora tenha virado símbolo dos progressistas, nem tanto.
De qualquer modo, o debate interno, pelo menos do ponto de vista do leigo do lado de fora, se dava em torno de questões políticas e teológicas.
A abordagem dos fiéis pelas duas correntes se executava por meio de argumentos religiosos ou sociais.
Os tempos mudaram muito. O conflito ideológico, não só na igreja, se amenizou. Esquerda e direita convergiram para o centro. A concorrência das igrejas pentecostais ameaça a hegemonia absoluta do catolicismo.
Parte da reação a essas mudanças foi a popularização do movimento carismático, do qual o padre Marcelo Rossi é o grande expoente.
Seu sucesso, de mercado pelo menos, é muito expressivo. Mas o efeito de sua pregação aeróbica-musical tem sido objeto de muitos reparos.
O problema, claro, não está na utilização da música para atrair e manter fiéis. A igreja tem se valido dela há séculos, com resultados notáveis, tanto religiosos quanto artísticos.
A questão é que a mensagem de Marcelo é esteticamente desprezível, socialmente omissa e espiritualmente vazia. O padre é um pop-star e só.
A tentação de aproveitar a penetração popular de artistas como Ratinho, Xuxa e Tiazinha não se exerce apenas sobre a igreja. O governo FHC também parece convencido de que basta mandar ministros aos programas dessas criaturas para ficar popular.
Igreja e governo, entretanto, são instituições diferentes do show-business. Seu êxito efetivo depende menos da imagem do que do conteúdo.


Texto Anterior: São Paulo - Clóvis Rossi: O poder, e depois
Próximo Texto: Brissac - Carlos Heitor Cony: O esplendor da relva
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.