São Paulo, sábado, 12 de maio de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PLÍNIO FRAGA

A santidade e os pecados nossos

RIO DE JANEIRO - O papa está por aí pregando contra os que ridicularizam o matrimônio e a virgindade. Se não mais se queixa ao bispo, agora se deve ouvir ao vivo as queixas do papa -logo sobre casamento e sexo, assuntos em que tem entendimento filosófico de sobra, mas experiência prática nenhuma. Está certo: o empirismo é obra ultrapassada, mas, corretamente ou não, é difícil aceitar sobre o melado opiniões de quem não se lambuza.
É engraçado lembrar que se popularizou no país, como origem da expressão folclórica "vá queixar-se ao bispo", a versão -nunca comprovada- de que no Brasil colonial cabia à autoridade eclesiástica permitir que noivos fizessem sexo antes do casamento para que fosse atestada a capacidade reprodutiva das mulheres. Muitos noivos fugiriam depois da conjunção carnal, restando à noiva ir queixar-se ao bispo. (A versão mais aceitável historicamente mostra a expressão como reflexo do papel dos bispos na mediação social e política em um Estado laico incipiente.)
É difícil entender quem ridiculariza o quê. A igreja não aceita o divórcio, esconjura o preservativo e as relações carnais, como se não fossem estas decorrentes de amor, ternura, devoção ao outro.
Um dos titulares deste espaço, Carlos Heitor Cony, consagrou a frase de que ser católico não é para quem quer, mas para quem pode. Deve ter razão, como sempre, mas, por mais que se entenda a lógica papal, a pregação poderia ser ao menos mais inteligente, contemporânea, talvez centrada no amor como um bem pessoal inalienável e por si demandador de exigências não conciliáveis com a licenciosidade e as relações frouxas tão combatidas pelo sucessor de Pedro. Este, por sinal, foi quem disse: "Acrescentai à vossa fé a virtude, e à virtude, a ciência". Modo de não se perder entre dogmas obscurantistas.


Texto Anterior: Brasília - Fernando Rodrigues: Uma oposição patética
Próximo Texto: Fernando Gabeira: Esse Congresso
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.