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TENDÊNCIAS/DEBATES
Repressão e políticas sociais resolvem
o problema dos distúrbios na França?
SIM
O restabelecimento da ordem republicana
HÉDI PICQUART
Há duas semanas a França vem
sendo palco de violentos incidentes. O balanço dos acontecimentos que
se desenrolam nos chamados bairros
sensíveis, até o dia 10/11, quando escrevo este artigo, é de mais de 7.000 veículos incendiados, uma centena de edifícios públicos depredados ou destruídos
e mais de cem policiais feridos.
Esses atos de violência têm como causa imediata dois acontecimentos trágicos ocorridos no departamento de Seine-Saint-Denis: uma agressão em Epinay, que resultou em morte, e a morte
acidental por eletrocução de dois adolescentes que haviam penetrado em um
transformador elétrico em Clichy-sous-Bois. Uma série de graves incidentes de
violência urbana veio em seguida.
Não é a primeira vez que a França, assim como qualquer outro país, passa
por acontecimentos dessa espécie. Vários fatores explicam a amplitude que os
incidentes assumiram: o desafio às instituições, a rivalidade entre bairros, cidades e até regiões, a criminalidade, a
"diversão" para os mais jovens. Por enquanto, nenhuma informação pode levar à conclusão de que esses incidentes
têm partido de uma organização geral,
pois eles não possuem nenhuma referência ideológica precisa nem líderes.
São atos de pequenos bandos estruturados e oriundos de um mesmo território.
Mas esses acontecimentos também
são condicionados por conflitos sociais
mais antigos: a amplitude e a duração
dos incidentes só podem ser explicadas
por rancores mais profundos surgidos
de uma sensação de injustiça diante de
um sentimento de discriminação e exclusão em relação às esperanças de integração e igualdade de oportunidades.
A prioridade imediata é restabelecer a
ordem republicana e fazer com que se
respeite a lei. A segurança é um direito, e
o respeito às regras, um dever. O primeiro dever do governo é o de garantir a
segurança de cada cidadão, assim como
a integridade de seus bens. Como ressaltou o primeiro-ministro, Dominique
de Villepin, na Assembléia Nacional, o
Estado será, no entanto, firme e justo.
O poder público colocou à disposição
das autoridades locais instrumentos jurídicos, inclusive os que permitem que
medidas excepcionais sejam tomadas,
para enfrentar, em caso de necessidade,
todas as manifestações de violência.
O governo reforçou os efetivos encarregados de fazer com que se respeite a
lei, apelando em grande escala para as
forças móveis, os serviços especializados (polícia judiciária, serviços de inteligência social etc.) e a reserva civil. Uma
iniciativa em dois sentidos foi tomada: a
informação (vigilância da internet e dos
blogs) e as patrulhas uniformizadas,
que são mais numerosas, mais bem
equipadas e formadas para interpelar os
delinqüentes pegos em flagrante e apresentá-los à Justiça. Até o dia 10/11, foram
feitas 1.500 interpelações, 1.700 prisões
temporárias e 235 condenações.
Além disso, só respostas de fundo nos
permitirão resolver de modo duradouro essa crise. Nas zonas sensíveis, restabeleceremos o diálogo em todos os níveis. A polícia de bairro, que está em
contato direto com a população, será reforçada. O prefeito, diariamente em
contato com os problemas específicos
de cada bairro, terá sua capacidade de
ação incrementada. Por fim, as associações, que também têm um papel essencial, receberão recursos suplementares.
Os incidentes mais violentos tiveram
como cenário regiões particularmente
afetadas pelo desemprego. Por isso, a
oferta de emprego para os jovens nas
zonas urbanas sensíveis também é uma
das maiores prioridades. Os esforços
sem precedentes empreendidos pelo
governo contra o desemprego desde o
mês de junho devem apresentar resultados concretos em breve.
A situação do subemprego é outra decorrência das dificuldades observadas
em nível escolar. Conseqüentemente,
lutaremos contra o baixo desempenho
na escola, facilitando particularmente o
acesso ao aprendizado e à formação
profissional e oferecendo mais apoio
aos alunos de maior mérito.
Um dos motivos de frustração está ligado à degradação do ambiente dos
grandes conjuntos suburbanos. Um dos
objetivos estabelecidos pelo governo no
que se refere às condições de vida é acelerar a renovação urbana, dentro do reduzido prazo de 18 meses, e a construção de novos conjuntos habitacionais
populares.
Por fim, todas as possibilidades de luta contra as discriminações serão exploradas de modo a identificar outras medidas a serem adotadas. A Alta Autoridade de Luta contra as Discriminações e
pela Igualdade de Oportunidades ganhará o poder de aplicar sanções: é preciso que, para diplomas e experiências
iguais, as oportunidades também sejam
iguais para todos.
Diante de uma crise dessa amplitude,
tudo será feito para restaurar a confiança nos valores republicanos de integração e igualdade de oportunidades.
Hédi Picquart, 49, diplomata, é conselheiro de
Imprensa e porta-voz da Embaixada da França
no Brasil.
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