São Paulo, sábado, 13 de maio de 2000


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Perguntar não ofende

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - O recado que o presidente da República mandou à classe política, da qual faz parte e da qual é beneficiário, além de revelar despreparo para a função executiva, é espantoso.
A nação ficou sabendo, por quem de direito, que a estrutura administrativa do país não é de nada, foi montada para conseguir apoios e pagar favores eleitorais, financeiros ou o que seja.
Se um cidadão vai a um ministério, dar entrada num processo qualquer, pode ser barrado por um contínuo que ali está não por ser competente e honesto, mas porque foi indicado por a ou b. Ampliando esse exemplo de base, o ministro despacha contra ou a favor do processo, mas não tem habilitação técnica ou moral para isso.
Está ministro porque faz parte da cota de determinado grupo que apóia o presidente. É descartável, não faz falta a nada e a ninguém. Se entende do assunto de sua pasta, ou nada entende dela, dá no mesmo. Como disse o Greca, o importante não é ser ministro: é ter sido.
Outro dia, um grupo de manifestantes andou xingando o presidente. Aos poucos, ele está se habituando a se deslocar pelo país de forma quase incógnita, entrando nos edifícios pela porta dos fundos. Lembro um tempo em que JK, aqui no Rio, ia almoçar na cidade, depois saía a pé, pelas ruas do centro, com um ou dois amigos, cumprimentava todo mundo, o único segurança à vista era o coronel Affonso Heliodoro, seu ajudante de ordens, que ia recolhendo cartões ou bilhetinhos.
Vi o presidente Dutra diversas vezes andando pela Cinelândia, a caminho da barbearia que ficava nos fundos do Clube Naval. Esse tinha uma cara feia, mas fazia o que era possível, tirava o chapéu para aqueles que o saudavam. E andava sozinho, sozinho mesmo.
Mudou o país, mudou o povo ou mudou a relação do poder com a sociedade?


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