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CLÓVIS ROSSI
Soros, febre e ditadura
SÃO PAULO - Suponhamos que o governo brasileiro tivesse mandado o
megainvestidor George Soros calar a
boca, como pede Luiz Inácio Lula da
Silva. Mudaria alguma coisa?
No máximo serviria de refresco para o orgulho ferido tupiniquim. Nada
mais. Equivaleria a quebrar o termômetro sem mexer nas causas da febre.
E a febre está dada pela ditadura dos
mercados, imposto não apenas ao
Brasil mas a todo o mundo dito
emergente.
George Soros não disse à Folha novidade alguma. Um mês antes, em
entrevista a Sérgio Dávila, correspondente do jornal em Nova York, Geoffrey Dennis (do Salomon Smith Barney) afirmara o seguinte:
"Mesmo que Lula implemente uma
política econômica totalmente liberal
no primeiro dia de seu governo, a
reação do mercado vai se antecipar a
isso. Assim, antes de ele assumir, os
títulos da dívida externa brasileira já
terão caído, o real já vai estar mais
desvalorizado, as taxas de juros provavelmente já terão subido...".
Nem eu, aliás, estou dizendo algo
novo. No dia 2 do mês passado, após
reproduzir a frase acima, acrescentei:
"É a mais crua confissão da ditadura
que os mercados impõem".
O ponto, portanto, não é o que dizem Soros ou Dennis. É até positivo
que o digam, porque chamam a atenção dos distraídos para a realidade.
Mesmo que ambos jamais abrissem a
boca, o mecanismo infernal continuaria em ação.
O ponto, portanto, é como enfrentar a inaceitável ditadura dos mercados. Um eventual caminho foi sensatamente defendido nesta mesma Folha pelo presidente nacional do PT,
José Dirceu, em sua reação à fala de
Soros: uma nova coalizão político-empresarial em torno de um projeto
de desenvolvimento nacional que
possa reduzir a dependência externa
e a vulnerabilidade do país.
Temo, no entanto, que soluções nacionais, por louváveis que sejam, não
bastem. A ditadura dos mercados é
global. Contê-la também necessita de
respostas globais.
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