São Paulo, quinta-feira, 13 de junho de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Soros, febre e ditadura

SÃO PAULO - Suponhamos que o governo brasileiro tivesse mandado o megainvestidor George Soros calar a boca, como pede Luiz Inácio Lula da Silva. Mudaria alguma coisa?
No máximo serviria de refresco para o orgulho ferido tupiniquim. Nada mais. Equivaleria a quebrar o termômetro sem mexer nas causas da febre. E a febre está dada pela ditadura dos mercados, imposto não apenas ao Brasil mas a todo o mundo dito emergente.
George Soros não disse à Folha novidade alguma. Um mês antes, em entrevista a Sérgio Dávila, correspondente do jornal em Nova York, Geoffrey Dennis (do Salomon Smith Barney) afirmara o seguinte:
"Mesmo que Lula implemente uma política econômica totalmente liberal no primeiro dia de seu governo, a reação do mercado vai se antecipar a isso. Assim, antes de ele assumir, os títulos da dívida externa brasileira já terão caído, o real já vai estar mais desvalorizado, as taxas de juros provavelmente já terão subido...".
Nem eu, aliás, estou dizendo algo novo. No dia 2 do mês passado, após reproduzir a frase acima, acrescentei: "É a mais crua confissão da ditadura que os mercados impõem".
O ponto, portanto, não é o que dizem Soros ou Dennis. É até positivo que o digam, porque chamam a atenção dos distraídos para a realidade. Mesmo que ambos jamais abrissem a boca, o mecanismo infernal continuaria em ação.
O ponto, portanto, é como enfrentar a inaceitável ditadura dos mercados. Um eventual caminho foi sensatamente defendido nesta mesma Folha pelo presidente nacional do PT, José Dirceu, em sua reação à fala de Soros: uma nova coalizão político-empresarial em torno de um projeto de desenvolvimento nacional que possa reduzir a dependência externa e a vulnerabilidade do país.
Temo, no entanto, que soluções nacionais, por louváveis que sejam, não bastem. A ditadura dos mercados é global. Contê-la também necessita de respostas globais.



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