São Paulo, domingo, 13 de outubro de 2002

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DO CENTRO À ESQUERDA

A chamada "mensagem das urnas", em termos do redesenho do mapa político-partidário do país, obviamente só poderá ser examinada com exatidão depois de 27 de outubro. Mas, a julgar pelos resultados já consolidados para o Legislativo, pelos Estados em que o governador foi eleito no domingo passado e pelos candidatos que se qualificaram para o segundo turno, seja nas disputas regionais, seja na presidencial, há um inegável avanço das forças de oposição, ou de centro-esquerda, na política brasileira.
A rodada decisiva para o Planalto é uma síntese desses resultados. O esquerdista Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, foi o candidato mais votado no Distrito Federal e em 23 dos 26 Estados. O segundo colocado, José Serra, do PSDB, representa, ele próprio, uma oscilação à esquerda no seio da aliança de Fernando Henrique Cardoso: Serra foi um opositor interno da política econômica, é considerado mais "intervencionista" por seus críticos ortodoxos e, diferentemente de FHC, sua aliança de primeiro turno não contou com o PFL, legenda situada mais à direita.
Dos 13 Estados que definiram o governador no domingo, em sete venceu uma legenda de esquerda e em três prevaleceu um partido de centro. Dos 28 candidatos a governador qualificados para o turno final, 11 são filiados a partidos de esquerda e 11 a agremiações de centro. Haverá sete disputas envolvendo uma legenda de esquerda e uma de centro -quatro delas serão entre o PT e o PSDB.
No Legislativo também se nota uma nova "onda" política. Nas Assembléias Legislativas dos cinco maiores colégios eleitorais (SP, MG, RJ, BA e RS), que agregam 56% do eleitorado nacional, os petistas conquistaram 19% de todas as cadeiras, convertendo-se na maior bancada em São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul. Na representação federal, o PT também avançou, tornando-se, com 91 deputados eleitos, a maior bancada da Câmara e a terceira força do Senado, com 14 parlamentares. Os principais "perdedores", aqui, foram PSDB, PMDB e PFL, que compuseram o núcleo da aliança de FHC.
O avanço do oposicionismo centro-esquerdista, no entanto, não significa que essas forças passaram a dominar o cenário político-partidário do país. A taxa de crescimento desses partidos parece ter sido capaz de atenuar -ou até de desfazer, a depender do resultado das eleições presidenciais- a hegemonia anterior, que pode ser ilustrada pela aliança centro-direitista que elegeu e sustentou FHC. Mas não foi suficiente para estabelecer uma nova dominância.
Note-se, a esse respeito, que Serra e o PSDB obtiveram alguns de seus melhores resultados eleitorais justamente em Estados ou cidades administradas pelo PT. Na cidade de São Paulo, o presidenciável tucano atingiu 30% dos votos válidos -contra sua média nacional de 23%. O Rio Grande do Sul foi o Estado em que Serra conquistou a sua segunda maior votação relativa, 32%. Os gaúchos e os sul-mato-grossenses decidiram não conceder mais quatro anos de governo local ao PT já no primeiro turno. Nos dois Estados haverá eleição para governador em 27 de outubro e, em ambos, o candidato petista corre risco de ser derrotado.
O ambiente político-partidário do país, portanto, se tornou mais pluralista depois das eleições de domingo. Nesse contexto, conquistar maiorias -seja no Congresso, seja nos Estados, seja na sociedade de modo geral- ficou necessariamente mais difícil, vença Lula ou ganhe Serra. Como a deterioração do quadro financeiro certamente vai exigir respostas urgentes do próximo presidente, serão necessários muita arte e muito engenho para que o sucessor de FHC, entre a emergência econômica e a complexidade política, consiga realizar um bom governo.



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