São Paulo, quarta-feira, 14 de abril de 2004

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CLÓVIS ROSSI

Violência, Estado e mercado

BRUXELAS - O IBGE acaba de dar a público o retrato da guerra civil não-declarada que consome o Brasil: 2,07 milhões de mortes violentas em 20 anos (de 1980 em diante).
Pior que o Vietnã, pior que o Afeganistão, pior que o Iraque, ainda que se deva dar o desconto de que as guerras nesses países duraram menos que 20 anos (no Iraque e no Afeganistão ainda estão em curso).
Mas fica sem graça, a esta altura, usar o clichê "o Iraque é aqui" ou suas variantes.
O que conta é constatar que, nesse capítulo, o mercado, que é solução para tantas coisas, vira parte do problema, e o Estado é (ou deveria ser) parte da solução.
O mercado de armas (legais ou ilegais) é parte do problema ao colocar instrumentos de morte nas mãos de tantos. O Estado deveria controlar esse mercado.
O mercado da droga (ilegal, mas sempre mercado) é um estímulo à criminalidade. O Estado deveria combater esse negócio, mas é incapaz ou impotente.
Por meritórias que sejam iniciativas educacionais de grupos empresariais, o fato é que educação de massa não é um assunto para o mercado, mas para o poder público.
Por mais que proliferem exércitos privados, também em matéria de segurança não se trata de tarefa para o mercado, mas para o Estado.
Executar tais tarefas com a eficiência indispensável custa dinheiro, como é óbvio. Mas a obsessão com o rigor orçamentário torna proibido reconhecer o óbvio, porque a constatação seguinte é a de que o equilíbrio fiscal se dá à custa da segurança pública, para não mencionar educação, saúde e muitos etc.
A polícia precisa ser saneada, precisa ganhar mais, precisa ser mais bem equipada. Fazer de conta que é possível controlar a guerra civil a baixo custo só levará, cedo ou tarde, à construção de muros em todas as favelas, o que também será inútil.
Todos os governos recentes e não tão recentes fracassaram nessa tarefa. São todos co-responsáveis pelos 2 milhões de mortos.


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