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REFORMA NA PRÁTICA
Num quadro de forte retração
econômica, juros estratosféricos e desemprego recorde, as negociações entre empresas do setor metalúrgico de São Paulo e seus trabalhadores deixam de se circunscrever
à rotina dos acordos sindicais e vão
ganhando contornos políticos. As
ameaças de demissões em massa feitas pelas empresas encontraram eco
na presidência da Fiesp, que procurou responsabilizar o Banco Central
pela situação: ou os juros começam a
cair ou não haverá alternativa. O presidente do Tribunal Superior do Trabalho manifestou-se com retórica
semelhante: a culpa é dos juros e dos
impostos. Os trabalhadores não podem pagar por isso.
As pressões fazem parte do jogo e,
mesmo assumindo certo tom de
chantagem, são compreensíveis,
quando se sabe que a política monetária vai, efetivamente, colocando a
economia em rota recessiva. Por
mais que possa haver heranças de
governos passados e problemas estruturais a superar na economia, não
há como retirar também dos ombros
do governo de Luiz Inácio Lula da Silva o ônus da atual estagnação econômica e do desemprego.
Ao mesmo tempo que fustigam a
ortodoxia do BC, os representantes
das empresas propõem aos trabalhadores uma agenda de negociação
draconiana: se querem preservar empregos, devem renunciar a acordos
firmados anteriormente e, até mesmo, a certos direitos trabalhistas assegurados pela Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT). Esse tipo de
proposta poderia ser relativizada pelo contexto de início de negociação.
Há uma gíria bastante conhecida que
resume a estratégia: colocar o "bode" na sala para que depois, obtidas
concessões, ele possa ser retirado.
Rediscutir encargos e direitos previstos pela CLT, no entanto, faz parte
da agenda política do setor empresarial e do próprio governo. Trabalhadores ameaçados pelo desemprego
em massa podem se ver compelidos
a abrir mão de suas prerrogativas para salvar o sustento do dia-a-dia. É
como se a reforma trabalhista fosse
sendo proposta e implantada, aos
poucos, na prática, numa conjuntura
ruim para todos.
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