São Paulo, sábado, 14 de dezembro de 2002

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O Senado deve aprovar a ampliação do foro privilegiado?

SIM

O foro não é privilégio

ROMERO JUCÁ

A questão do foro dito privilegiado tem sido insistentemente discutida pela maioria dos veículos de opinião pública do país. Mas, a meu ver, não tem sido analisada na sua inteireza. Alguns setores têm feito até uma leitura equivocada.
O que se quer não é criar uma proteção para políticos ou, de certa forma, até uma distinção entre categorias de pessoas no país. Essa não é a intenção. Aliás, taxar a medida de "foro privilegiado" faz parte da leitura equivocada.
A medida prevê não a imunidade para alguns, mas uma localização específica para o julgamento de qualquer ação a ser movida contra atos de ex-governantes no exercício específico de seus mandatos. Isso serve para presidentes da República, ministros, governadores, secretários de Estado e prefeitos.
Por que o foro proposto não é privilegiado?
Tomemos como exemplo os governadores, para quem são propostos julgamentos no Superior Tribunal de Justiça. Ora, o STJ não é um privilégio, trata-se de um direito de todo cidadão. Se os governadores fossem julgados a partir da primeira instância -como querem os que se opõem ao foro-, um dia o processo também chegaria ao STJ, mas só após dez ou 15 anos. O que, ao retardar por demais a apuração e punição (se necessária), inclusive suprimiria o efeito educativo e simbólico de julgar rapidamente uma ação para liberar ou punir o responsável.
Portanto trata-se de um foro respectivo para agentes públicos, cuja missão primeira é apressar votações e julgamentos.
Continuemos no exemplo dos governadores: no modelo defendido por parte da mídia, o ex-governador, sobre o qual recairia a ação, seria julgado antes por um juiz de primeira instância, portanto em seu próprio Estado. Que consequências trariam os envolvimentos políticos ali existentes (entre estes, a possibilidade de esse juiz ter ligações pessoais com o ex-governante, podendo até engavetar o processo)?
Seguindo no exemplo: depois do demorado processo da primeira instância, em que cabem mil desvios, haveria recurso à segunda instância. E ali, novamente, os mesmos componentes da fase anterior e outro, ainda mais político: para o ex-governador, que certamente nomeou uma série de desembargadores, ali sim, talvez, o tratamento fosse privilegiado. E lá viria outro processo demorado, para no fim, anos depois, caber outro recurso. Desta feita ao STJ.
Ora, o que é melhor para o serviço público, para a sociedade, para a transparência? Efetivamente, o melhor será o processo ir direto para o STJ, onde será julgado por ministros que não foram nomeados pelo ex-governador -logo isentos-, cuja atuação fica exposta à opinião pública nacional. Claro que, nesta opção, o julgamento será muito mais ágil e transparente para a sociedade. Ainda mais que, uma vez no STJ, o único recurso cabível, se houver matéria constitucional, é no Supremo Tribunal Federal. Ou seja, mais uma vez o foro respectivo reduziria o tempo do processo, e aqui de forma muito intensa.
Quanto ao caso de presidentes da República e ministros, o foro localiza o julgamento direto no Supremo. Uma instituição composta por excelências jurídicas e de biografia irrefutável. Pessoas acima de qualquer desconfiança, que garantiriam a isenção que talvez não houvesse na primeira instância de um Estado -em que um juiz ou o Ministério Público, para, por exemplo, buscar notoriedade, poderiam até decretar a prisão de um ex-presidente ou ministro apenas no intuito de aparecer na primeira página dos jornais.
Novamente, faz-se imprescindível ressaltar a questão do prazo: neste caso, também estamos acelerando o julgamento de ex-presidentes e ministros. Até porque no Supremo não cabem recursos. Ou seja, mais uma vez o que se objetiva é um julgamento rápido, incisivo e transparente, desta feita realizado pela maior corte de Justiça do país. Portanto de resultado inquestionável.
Finalizo enfatizando: o foro respectivo não pode ser considerado privilegiado. Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal não são privilégio de ninguém, são direitos de todo cidadão. O que se busca com essa proposta é suprimir instâncias para agilizar julgamentos e garantir-lhes os mais inquestionáveis resultados.


Romero Jucá Filho, 48, economista, senador pelo PSDB-RR, é o líder do governo no Senado. Foi presidente da Funai (1986-88) e governador de Roraima (1988-90).



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