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O caçador de cérebros
CARLOS HEITOR CONY
Rio de Janeiro - Bem ou mal, após os
últimos escândalos revelados pelas
criminosas mas ainda não apuradas
escutas telefônicas, a classe política,
como um todo, ficou tensa. Inocentes e
pecadores, com culpa ou sem ela, sentem a barra pesada. De uma hora para outra, um grampo, uma secretária
distraída, um motorista com escrúpulo podem pulverizar uma reputação e
criar um furacão na vida nacional.
Daí a seriedade que se vê nos rostos e
falas dos dirigentes e dos congressistas. Até provarem que não são elefantes, o poder e a honra podem sumir
pelo ralo.
Há uma exceção. Por incrível que
pareça, é a do ex-ministro Mendonça
de Barros, por sinal o principal envolvido no caso da privatização das teles.
Ele continua jucundo, falando pelos
cotovelos, como se nada tivesse acontecido. Sente-se até mais prestigiado
pelo presidente da República, que nele
continua confiando e atribuindo-lhe,
entre outras missões relevantes, a de
caçar cérebros para a formação do novo governo.
É um ofício no qual ele se declara
mestre. Conhece os melhores cérebros
do país. Acima dos partidos, das correntes de opinião, ele é realmente o
mais indicado para separar o joio do
trigo. Ao contrário de Ovídio, que conhecia o bem e o mal mas seguia o
pior, ele sabe o que é o crime, o que é
virtude, e considera-se virtuoso.
Tamanho gáudio não foi contestado
por FHC. Acuado pelos fatos, o presidente da República mandou um recado genérico à nação, declarando que
quem manda no governo é ele e não o
presidente do Senado.
Nada fez para contestar seu ex-ministro, que fora do poder exibe poder
maior: o de indicar cérebros para a
nova máquina que vai continuar salvando o país.
Nem o finado Sérgio Motta, em seus
melhores dias, exibia tamanha desenvoltura. Como até agora eu não recebi
nenhum sinal de que o homem das teles anda me caçando, começo a suspeitar de que ele realmente tem essa
importante missão.
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