São Paulo, sábado, 15 de maio de 2004

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RELIGIÃO E ESTADO

É preocupante a decisão do governo fluminense de introduzir o ensino do criacionismo nas escolas estaduais. A Bíblia e o belo relato do "Gênesis" sobre a origem da Terra merecem todo o respeito, é claro, mas é preciso aqui repetir o velho brocado: cada coisa no seu lugar.
Há algo de esquizofrênico em um aluno entrar na aula de ciências e aprender que o homem é o resultado de milhões e milhões de anos de seleção natural, como estabeleceu o naturalista Charles Darwin (1809-1882), e, em seguida, ouvir do professor de religião que Adão e Eva foram feitos "à imagem e semelhança de Deus" no sexto dia da criação.
Para evitar esse tipo de situação abstrusa, o ideal é que igrejas ensinem religião e que as escolas da rede oficial fiquem com a ciência. Infelizmente, a Constituição de 1988, num duro golpe contra a separação entre Estado e igreja, estabeleceu o ensino religioso, de matrícula facultativa, como disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental (art. 210).
O mandamento constitucional, porém, está longe de significar que o Estado deva chancelar a versão bíblica do surgimento do mundo. Aceitá-la ou não é uma decisão individual, que passa pela fé de cada um. Já o evolucionismo darwiniano é ciência baseada em fatos comprováveis.
A sensação que fica é a de que a governadora Rosinha Matheus e o seu marido, Anthony Garotinho, estão se utilizando do sistema educacional para conquistar a simpatia de grupos religiosos e, com isso, alimentar suas aspirações políticas.
De resto, nunca é demais insistir no fato de que foi a separação entre Estado e igreja que permitiu o surgimento das democracias contemporâneas. A Carta brasileira de 88, infelizmente, consagrou um retrocesso ao estabelecer o ensino religioso financiado pelo Estado.


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