|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CLÓVIS ROSSI
Terra estrangeira
SÃO PAULO- Descubro na reportagem de Fabio Cypriano para a Ilustrada de ontem que "a arquitetura se
transformou em instrumento de publicidade" (de uma cidade), segundo
a opinião de Joel Sanders, curador da
mostra sobre Nova York, parte da
Bienal de Arquitetura de São Paulo,
programada para setembro.
Se é assim, São Paulo deve ser uma
baita dor de cabeça. Com todo o respeito pela bela coleção de notáveis arquitetos que aqui trabalham e produzem ou produziram, a cidade, no conjunto, choca pelo feio.
Dias atrás, fui conversar no 26º andar do Hilton Morumbi com o encarregado de negócios do Canadá no
Brasil, Alain Latulippe. Fui dar uma
olhada pelos janelões e não consegui
me conter: "Que cidade horrorosa",
comentei. Bom diplomata, Latulippe
não disse nada. Por dever de ofício,
não podia concordar. Mas seria cinismo dizer o contrário.
O Hilton fica em um bairro supostamente nobre, suas janelas dão para
um rio (no caso, o Pinheiros), o que
geralmente serve de enfeite em uma
cidade, mas, mesmo assim, a vista
não tem a menor graça.
Leio, sempre na Ilustrada, que São
Paulo será uma das sete metrópoles
que terão sua própria fatia na Bienal
de Arquitetura. Deve, de fato, haver
preciosidades em vários pontos da cidade, mas, repito, se a publicidade de
São Paulo depender do conjunto da
obra, pouca gente se animará a vir
para cá.
Não se trata de crítica de "estrangeiro" de origem. Nasci em São Paulo
e nela vivi todos os meus 60 anos, salvo quatro anos como correspondente
no exterior e sei lá quantos em viagens profissionais.
Mas, cada vez que o avião começa a
sobrevoar a cidade, nos vôos de volta,
assusta-me a visão lá de cima, pela
formidável massa inóspita de concreto que se vê lá em baixo.
Pior: não consigo localizar no tempo o momento em que São Paulo começou a perder o caráter acolhedor
de cidade natal para se transformar
em terra estrangeira mesmo para um
paulistano.
Texto Anterior: Editoriais: APOIO AO PARAGUAI
Próximo Texto: Brasília - Eliane Cantanhêde: Dirceu fala Índice
|