São Paulo, terça-feira, 15 de agosto de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Mais do que salvaguardas

CHARLES A. TANG

MUITO MAIS do que salvaguardas, a indústria nacional requer, sobretudo, condições necessárias para a competitividade. É difícil concorrer no mercado internacional, carregando o "custo Brasil", com 61 tributos exóticos e escorchantes, juros exorbitantes, leis trabalhistas arcaicas (de 1941), corrupção e morosa burocracia. Nosso clamor por defesas comerciais ofusca a verdadeira questão: corrigir as causas da nossa falta de competitividade. A China ou outras nações de baixo custo não deixarão de exportar, devem aprimorar sua eficiência e aumentar seu comércio exterior. Será que não devemos concentrar esforços na conquista de condições para competir, em vez de criar medidas artificiais de proteção?


Muito mais do que salvaguardas, a indústria nacional requer, sobretudo, condições necessárias para a competitividade


Estando a vantagem a favor dos produtos chineses, medidas de defesa comercial não terão efeito duradouro. Corremos o risco de criar novos dinossauros, como fizemos com a indústria de informática no passado. No lugar de defesas, devemos exigir a criação de condições para a competitividade da nossa indústria, mirando como prioridade estratégica o desenvolvimento de um Brasil próspero.
Por ocasião da inauguração de um pioneiro escritório chinês, o presidente da Abimaq (Associação Brasileira de Indústrias de Máquinas e Equipamentos) defendeu a formação de condições para competitividade em vez de salvaguardas e de culpar os chineses pelo "custo Brasil". Essa posição demonstra a visão, lucidez e coragem de que necessitamos para fomentar nossa caminhada para a modernidade e a eficiência.
Outro complicador é que, nos últimos cinco anos, o Brasil conseguiu fazer um grande "negócio da China", justamente na parceria com os chineses. Com isso, acumulamos superávit de US$ 7 bilhões desde 2001. A adoção de medidas de salvaguarda contra um parceiro comercial que nos tem proporcionado tamanhos lucros pode resultar num tiro no próprio pé.
A China está se posicionando para investir cada vez mais no Brasil, não por promessas ou favores, mas para assegurar o fluxo regular dos produtos estratégicos de que necessita para seu crescimento sustentado e para a alimentação de seu povo. Todavia, a demora de anos para conseguir autorização ambiental e zoneamento municipal e a voraz taxação sobre investimentos, como acontece com o projeto de instalação de uma usina siderúrgica no Maranhão, podem desanimar outros investimentos chineses.
Empresários brasileiros que pouco conhecem a China a consideram uma ameaça. Os que buscam descobrir as oportunidades que ela oferece fazem excelentes "negócios da China". Em outubro de 2004, a Câmara Brasil-China (CCIBC) organizou uma visita de grandes indústrias têxteis à China. Estiveram na Feira de Guangzhou (Cantão), representada no Brasil pela CCIBC, e foram recepcionados em Pequim com um banquete oferecido pelo presidente da Câmara Chinesa de Importação e Exportação da Indústria Têxtil. Na cidade de Wuxi, tiveram uma rodada de negócios com presidentes e diretores de grandes indústrias desse importante centro têxtil e foram recebidas calorosamente pelo prefeito. A maioria dessas indústrias brasileiras estão lucrando com "negócios da China".
Enquanto não encontram condições de competitividade no Brasil, cada vez mais empresas brasileiras estão investindo e gerando empregos na China e em outros países de menor custo. Só assim elas podem ter um preço que lhes possibilite ingressar naquele mercado. Com isso, terão uma plataforma de custo baixo para poder entrar nos mercados da América do Norte e da Europa, além de suprir suas necessidades no Brasil.
Existem oportunidades também para as pequenas e médias empresas têxteis brasileiras. Enquanto compete agressivamente na exportação de confecções, a China é a maior importadora de moda do mundo. Estamos realizando esforços para que a moda brasileira possa participar de "fashion weeks" em Pequim e Xangai e para que compradores chineses venham assistir às "fashion weeks" do Brasil.
A importação de matérias primas, como fibras, tecidos e corantes, além de acessórios, como botões e zíperes, e máquinas e equipamentos chineses, pode contribuir para reduzir custos da indústria brasileira.
Como não iremos conseguir conter o crescimento da China e das suas exportações, temos de transformar os desafios em oportunidades. A parceria construtiva entre as indústrias do Brasil e da China ajudará a fortalecer ambas as partes.
CHARLES ANDREW TANG , 60, membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, é presidente binacional da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China.


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