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São Paulo, segunda-feira, 15 de setembro de 2003

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Educação e qualidade

EDEVALDO ALVES DA SILVA


Alunos estimulados à indagação permanente tendem a tirar proveito e consequência dos seus cursos

Uma verdade inconteste foi determinada pela Unesco, numa de suas últimas reuniões, em Paris: "a aprendizagem é para toda a vida". Mas não é qualquer tipo de ensino e aprendizagem. A qualidade é fator determinante do cumprimento adequado desse preceito.
Os alunos não se deixam mais iludir. Até porque o mercado de trabalho tornou-se bem mais sofisticado, não aceita profissionais apenas titulados. Exige qualidade nos cursos, pois só o diploma não garante o acesso completo ao conhecimento. Já foi o tempo em que se viveu dessa ilusão. Orientar para continuar aprendendo durante toda a vida é uma virtude da educação de boa qualidade.
Exemplifiquemos com o curso de direito. Os alunos se formam e, se não estiverem culturalmente aptos para o exercício dessa nobre profissão, correm o risco de não passar nos exames da OAB. De que maneira, assim, poderão eles alcançar os quadros da magistratura, cada vez mais exigente?
O conceito de qualidade em educação pode ter várias interpretações, pois depende da concepção que o educador tenha dos fins do processo educativo e dos rumos que devem ser seguidos na formação do ser humano. De modo semelhante, os critérios para a avaliação da qualidade da educação continuam sendo objeto de controvérsias, como as vividas hoje na educação brasileira. Contudo podemos dizer que a qualidade é um produto intrínseco dos cursos oferecidos, integra a alma das escolas, com uma dependência direta da formação e do aperfeiçoamento dos seus professores. Estes hoje estão convencidos de que a educação é contínua, pois os conhecimentos, também nas ciências humanas, são modificados diariamente, dada a rapidez dos avanços científicos e tecnológicos.
Ouvimos palavras de grande sabedoria do ministro Cristovam Buarque, em visita recente feita à UniFMU. Para ele, modernidade é a presença de todos os jovens na escola, mas com a garantia de um bom ensino, responsabilidade de diretores e professores. É preciso reparar como se trata de um processo amplo, de que participam ativamente todos os integrantes de uma comunidade universitária. Não pode ser apenas a vontade de uma dessas categorias. É um jogo estritamente solidário.
Por isso, a avaliação continuada tornou-se uma exigência de quem leva o ensino a sério. Seja a avaliação interna, com a presença de mestres e doutores da instituição, seja a avaliação externa, que só pode ser temida por aqueles que não entendem o real significado do processo avaliatório para a obtenção de padrões cada vez mais elevados de qualidade em todos os níveis de educação.
O trinômio educação-ciência-tecnologia é a base do que o estudioso John Kenneth Galbraith chamou de tecnoestrutura. Aqui se deve incluir a presença do governo, e a equação estará armada.
O presidente Lula jamais esteve infenso a essa prioridade conjugada, tanto que o seu programa "Um Brasil para todos" apresenta essas vertentes como "objetivo estratégico" -e com razão. O objetivo? Inserir o Brasil soberanamente no mundo, promovendo a supressão da exclusão e da desigualdade social. Pode-se fazer isso com uma educação deficiente ou uma ciência periférica? Duvidamos muito.
Devemos ensinar aos nossos alunos, como sempre exigiu a cultura do "magister dixit", mas o processo se enriquece quando os alunos também ensinam aos professores, num processo simbiótico de trocas. A educação não se faz só de cima para baixo. Alunos estimulados à indagação permanente, que recorrem a livros e laboratórios de qualidade (atualizados), tendem a tirar proveito e consequência dos seus cursos. Essa não é uma realidade que possa ser encontrada em todas as escolas superiores do nosso Estado, para não citar o país, onde as deficiências são ainda maiores.
Não será exagero atribuir a uma vontade política nacional o sucesso da performance pedagógica. Há cerca de 30 anos, países como a Coréia do Sul, a Irlanda e a Finlândia, para ficar só nesses exemplos, não tinham posição de destaque na economia mundial. Como se tornaram referências internacionais?
A Irlanda é o maior exportador de software educativo (setor em que a Índia também se destaca) e a Finlândia tem a maior presença de tecnologia de ponta, que é a Nokia, hoje dominando a metade dos celulares utilizados nos EUA. Isso tudo provém das prioridades estabelecidas pelas respectivas nações no campo educacional. Chegamos a essa conclusão depois de muitos anos de estudos e uma vivência de 35 anos no ensino superior, o que confere autoridade ao que vimos proclamando.
Vale uma outra referência: atinge-se a qualidade e isso é reconhecido pela comunidade da instituição, não por decreto. É a soma das considerações anteriores com as salas arejadas e confortáveis, os laboratórios moderníssimos, as bibliotecas atualizadas e com periódicos de valor, computadores de última geração, acesso fácil à internet e outros procedimentos hoje disponíveis para os bem intencionados, graças à expansão das tecnologias educacionais.
Quem não tiver esse tipo de estrutura em todos os seus cursos estará condenado a baixos conceitos e ao juízo rigoroso dos seus próprios alunos. Depois, o que vem a ser pior, o veredicto do mercado de trabalho. Se o jovem não for competente, dificilmente obterá o emprego necessário. O que será da sua vida?


Edevaldo Alves da Silva, 70, advogado e professor, é presidente das instituições UniFMU, UniFiamFaam e Fisp e reitor do UniCEUB.


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