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CARLOS HEITOR CONY
Assim não dá
RIO DE JANEIRO - Duas recentes declarações do presidente da República
devem ser analisadas. Numa delas,
confessou que nos nove meses de governo mal conseguiu 1% do que pretendia. A humildade lhe faz bem,
mas o pequeno percentual que ele se
atribui não parece visível. E não é o
cronista que constata a falta de visibilidade de seus feitos.
Foi o próprio Lula que, na segunda
declaração da semana passada, admitiu que determinada obra parou
"por falta de planejamento", e não
por falta de dinheiro. A obra em
questão é uma ponte sobre o rio Paranaíba, que separa Mato Grosso do
Sul de Minas Gerais.
Arrastou-se por dez anos e custou
R$ 124 milhões. Bem, ele jogou a culpa nas administrações anteriores,
mas, em matéria de obras, daquilo
que chamou de "espetáculo do crescimento", ele se queixa de estar sem dinheiro e, em matéria de planejamento, até agora só planejou mudanças
conceituais, tentando operacionalizar o Estado ideal que o PT tanto discute em suas assembléias.
O exemplo de JK é inevitável. Ele se
elegeu com percentual bem menor do
que o de Lula, teve a posse ameaçada
por dois golpes de Estado, que depuseram dois presidentes em exercício,
enfrentou duas rebeliões militares.
Aceitou placidamente o Estado que a
Constituição da época lhe dava e com
ela governou. Não propôs nenhuma
reforma, não deixou que a classe política que o apoiava lhe aumentasse
poderes e mandato e, assim mesmo,
fez o Brasil avançar 50 anos em apenas cinco de governo.
Gosto sempre de citar Maria Victoria Benevides, que escreveu o melhor
livro sobre o governo JK e é uma das
gurus do pensamento petista. Sem reformar e, muito menos, sem revolucionar o Estado, JK conseguiu alterar
profundamente o "status quo" da sociedade brasileira. À custa de um planejamento que, no mérito, pode ser
discutido, mas que, na prática, foi
realizado por sua vontade política,
criando um Brasil diferente, para
não dizer novo.
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