São Paulo, quarta-feira, 15 de dezembro de 2004

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CINZAS DA HISTÓRIA

É inquietante a notícia de que arquivos militares teriam sido queimados na Base Aérea de Salvador. De acordo com reportagem do "Fantástico", da TV Globo, prontuários, fichas e relatórios produzidos por órgãos de informação das Forças Armadas foram incinerados. Parte do material escapou ao fogo. São papéis que datam de 1964 até 1994, já sob vigência do regime democrático.
O episódio deveria servir para acelerar a abertura dos arquivos da ditadura militar (1964-1985) e anteriores que ainda permaneçam secretos. Se fichários foram queimados em Salvador, há razões para temer que muitos outros papéis estejam enfrentando o mesmo destino em vários outros pontos do país. As perdas para a história podem ser irreparáveis.
Tão importante quanto franquear o acesso do público aos arquivos históricos do regime militar e estabelecer um marco regulatório decente para a liberação de documentos secretos -do qual a lamentável figura do sigilo eterno seja definitivamente proscrita- é fomentar uma cultura do arquivo público. Tudo o que um servidor do Estado diga ou escreva no exercício de suas funções deve em princípio converter-se em documentação que um dia será franqueada à população -e ao escrutínio dos historiadores. O que quer que um agente público atuando nessa condição faça não lhe pertence nem à sua privacidade, mas à população sob cujo mandato ele agiu.
É claro que determinados papéis podem precisar permanecer ocultos por algum tempo, considerando-se que segredos de Estado são um mal necessário. Todavia o sigilo, que sempre deve ser provisório, precisa ficar restrito a casos realmente justificáveis. Preservar documentos longe dos olhos da sociedade deve ser a exceção e não a regra.
É essa cultura que está faltando ao país. Além de contribuir enormemente para a historiografia, ela ajudaria a estabelecer a noção republicana de que o servidor público deve satisfações à população.


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