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RUY CASTRO
Quem são os animais?
RIO DE JANEIRO - Meu gato Fu
Manchu, 6 anos, baixou hospital na
semana passada. O que parecia uma
infecção urinária revelou-se uma
obstrução na uretra, provocada por
cálculos na bexiga -cinco cristais
intrometidos, que se alojaram ali
para provocar agonia e dor. De repente, foi preciso operar. Durante
alguns dias, fiquei privado de uma
companhia que sempre me confortou, por amorosa e alerta.
Tanto em casa como na clínica felina onde o internamos, em Botafogo, pude sentir a entrega dos profissionais que o cuidaram. Já passei
por muitos gatos e veterinários, e
sempre achei que a relação entre
eles era especial. Como, por deficiência humana, não somos capazes
de dialogar com os gatos e perguntar sobre seus sintomas, o veterinário precisa de mais que ciência
e sensibilidade para chegar ao problema e à solução.
Precisa, por exemplo, de humildade, para estar ali a tratar de um
ser que, pelos padrões estabelecidos pelo homem, não pertence à escala superior deste mesmo homem.
No entanto, o que se coloca em suas
mãos, na mesa de cirurgia, é uma vida tão preciosa como qualquer outra -e que é cara aos que cuidam ou
se deixam cuidar por ela. Sempre
que entreguei um gato a um veterinário, torci para que este fosse o
melhor ser humano que eu poderia
ter escolhido naquele momento.
Daí que o trote selvagem aplicado
há uma semana pelos veteranos de
uma escola de veterinária em Leme, SP, num calouro -chutes, chicotadas, intoxicação alcoólica e ser
lambuzado com fezes e com animais em decomposição- levou-me
a pensar melhor nas relações entre
humanos e animais. Fez-me perguntar: "Quem são os animais?".
Gostaria de saber os nomes daqueles futuros veterinários -para,
nem por acaso, um dia, deixar um
de meus gatos ao alcance de sua
ferocidade.
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