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CLÓVIS ROSSI
É possível dizer "não"
CANCÚN - Lembra-se do PT que dizia "não"? Pois é: uma coleção de PTs
que disseram "não" pôs a pique, domingo, a Conferência Ministerial da
OMC. Refiro-me a um grupo de países em desenvolvimento que disse
"não" à insistência do mundo rico
em incluir na agenda comercial temas para os quais os pobres e remediados ainda não se sentem preparados.
Pior para o PT que passou a dizer
apenas "sim": funciona. O fracasso
da reunião da OMC não foi o fim do
mundo, os mercados trabalharam
ontem com a normalidade habitual,
subindo ou baixando de acordo com
jogos que não têm muito a ver com a
OMC, e a vida continua.
O paradoxal é que o "PT for export"
-ou seja, a sua política externa-
também estava no clube dos que disseram "não". Foi em outro assunto e
contexto, mas foi "não": rebelou-se
contra um projeto de texto sobre a
abertura do comércio agrícola que
não satisfazia o Brasil, arrebanhou
um punhado de países em desenvolvimento (praticamente todos os
grandes) e enfrentou os Estados Unidos e a União Européia, que tinham
a sua própria e modesta proposta
conjunta.
Tanto funciona que europeus e
norte-americanos ficaram furiosos e
passaram quase toda a reunião de
Cancún malhando a posição brasileira e de seus novos sócios.
Fico me perguntando se funcionaria também um "não" a, por exemplo, aumentar os juros logo no início
do governo ou a aumentar o superávit primário (receitas menos despesas, fora juros) também nos primeiros dias do PT que diz "sim".
Ninguém tem a resposta, claro, porque não é possível saber o que aconteceria se tivesse havido o que não houve. Mas os episódios de Cancún mostram que uma boa amarração com
outros países pode servir eventualmente para sustentar políticas internas. A amarração já está feita e não é
obrigatório limitá-las aos entendimentos na OMC.
A outra ponta é chamar a sociedade civil (leia-se ONGs) para dizer
"não" em conjunto com o governo a
exigências do mundo rico incompatíveis com as necessidades internas.
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