São Paulo, sábado, 17 de fevereiro de 2007

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FERNANDO RODRIGUES

Cinismo político

BRASÍLIA - A primeira coisa ouvida em Brasília quando se começa a fazer a cobertura jornalística do poder é o velho axioma derrotista: "política é a arte do possível". Em resumo: não me venha com propostas muito moralizadoras. É tempo perdido. Perca as suas ilusões. Pense pequeno. Esse é o recado dominante, do PT ao PSDB, do PFL ao PC do B.
Deputados, senadores, ministros e presidente da República logo dão aquele sorrizinho maroto se alguém pergunta sobre certas alterações de fato necessárias para aprimorar as instituições. Por exemplo, no caso da reforma política, todos sabem que nunca será feita.
O cinismo é mais forte em início de governo, como agora. É fascinante nenhuma proposta de reforma política com algum peso dentro do governo e do Congresso tocar no ponto central da anomalia maior da democracia representativa brasileira: a inexistência do sistema de "um homem-um voto".
Na Câmara, todas as unidades da Federação têm, no mínimo, oito cadeiras. Dessa forma, Acre, Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins ostentam 64 deputados.
Se fosse considerada a população dessas localidades, deveriam ser apenas 31. Quem paga essa conta de deputados sem voto? A fisiologia miúda, que produz mensalões, sanguessugas e outros bichos. Há chances reais de essa injustiça democrática ser banida? Depende.
Os deputados jamais cortarão seus próprios direitos. Mas o ponto não é esse. O mais significativo é que poucos hoje se dão ao trabalho de colocar o dedo nessa ferida. Renunciamos ao direito de sonhar com um país mais justo. Como hoje é Carnaval, fica até apropriado falar de tal fantasia.

 

Folgo duas semanas. Volto a tempo de escrever sobre os titubeios de Lula para nomear ministros.

frodriguesbsb@uol.com.br

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