São Paulo, terça-feira, 17 de abril de 2001

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A MANIA DA MORDAÇA

Em sua mais recente investida, Gilmar Mendes, o advogado-geral da União, lançou-se contra o Supremo Tribunal Federal. Enviou a essa corte um protesto formal contra o hábito de alguns ministros de dar declarações a jornalistas em "off", ou seja, sob a condição de não terem seus nomes revelados.
O instituto do "off" é obviamente matéria para amplas discussões. Num plano ideal, ele não deveria existir. Em princípio, ninguém deveria ter de se esconder sob o anonimato para dizer o que pensa ou sabe. O mundo, infelizmente, é menos perfeito do que seria desejável. O "off", assim, apesar de seu caráter insidioso e até promíscuo, revelou-se um instrumento valioso para o exercício da liberdade de imprensa e, por extensão, uma ferramenta útil na fiscalização do poder público. O "off" dá, por certo, margem a abusos, mas ainda é preferível uma imprensa que erra a uma que não se manifesta. Abusos devem ser punidos.
Não é à toa que a Constituição de 1988 deu abrigo ao "off", inscrevendo-o entre os direitos e garantias fundamentais. O inciso XIV do artigo 5º é cristalino: "É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional".
Faz sentido, por outro lado, sustentar que juízes têm o dever de calar sobre processos que estão julgando. Mas os limites entre a visão de mundo -que todo cidadão é livre para manifestar- e a opinião legal são tênues. Essa é uma questão sobre a qual cada magistrado pode e deve refletir profundamente.
De resto, qualquer diploma visando a regular o "off" é, pelo próprio caráter sigiloso do instituto, inaplicável. Seu efeito mais notável seria o de desmoralizar uma eventual lei.
A iniciativa de Mendes deve ser vista antes como a do advogado-geral da União defendendo os interesses do governo. Vale lembrar que ao jurista, que já propôs várias modalidades de Lei da Mordaça, jamais ocorreu de tentar impedir que o governo ou ele próprio falassem "off" quando lhes conviesse.


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