São Paulo, sexta-feira, 17 de maio de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Um país mais justo e solidário

JAIR MENEGUELLI

A Constituição Federal proclama como direito social, entre outros, o direito à saúde e veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios instituir impostos, entre outros, sobre templos de qualquer culto; sobre patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos e suas fundações; das entidades sindicais dos trabalhadores; das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos; dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado à sua impressão.
Sem querer entrar na discussão sobre o acerto das prioridades que os legisladores de 1988 tinham em mente ao redigirem aquela norma constitucional, entendemos que, hoje, a inclusão no citado dispositivo dos medicamentos incluídos em programas governamentais de assistência farmacêutica é medida de extrema oportunidade, de inteira justiça e de elevado alcance social, que tem o mérito adicional de procurar dar efetividade ao princípio segundo o qual todos devem ter direito à saúde.
É o que pretendemos com a proposta de emenda constitucional que submetemos ao exame do Congresso Nacional, nascida da constatação de que a população de idosos no Brasil é significativa e tende a crescer muito nos próximos anos; de que a crise da saúde decorre, em grande parte, desse envelhecimento da população e do crescimento relativo de doenças crônicas; e da necessidade de adoção de uma política de gradual transferência de benefícios para os setores populares.
O Congresso Nacional, devemos admitir, é sensível ao problema, tanto que ali foi criada a bancada da saúde, composta por 138 deputados e 12 senadores, que, não obstante os diferentes enfoques defendidos para a solução do angustiante problema da saúde no país, priorizam a sua atuação a fim de alocar mais recursos para o setor.
Na Casa também têm sido apresentados inúmeros projetos de lei objetivando isentar de impostos medicamentos e equipamentos hospitalares. Muitos deles recebem aplausos generalizados e até alguns pareceres favoráveis das comissões para as quais são distribuídos, mas esbarram quase sempre no argumento da inoportunidade, tendo em vista a expectativa de uma reforma tributária que tramita há muitos anos no Congresso.
Ocorre que, embora ela possa modificar inteiramente toda a sistemática de incidência de impostos e contribuições atualmente vigentes, poucos acreditam que ela prospere, em face, sobretudo, das opiniões divergentes da União, dos Estados e dos municípios.
Além do mais, a solução ora proposta, de acréscimo de uma alínea ao artigo 150 da atual Constituição Federal, é o melhor tratamento que se pode dar à questão, sobretudo porque, da forma que está redigido, permitirá ao eventual titular da pasta da Saúde definir quais serão os programas de assistência farmacêutica que pretende privilegiar e, por conseguinte, os medicamentos sobre os quais não haverá incidência de impostos, bem como, ainda, diante de eventuais avanços das pesquisas médicas, que ensejem a cura de algumas doenças hoje crônicas, não permitirá a obsolescência daquele dispositivo constitucional.


Devemos nos empenhar em garantir o acesso das camadas menos favorecidas ao medicamento


Devemos nos empenhar em garantir o acesso das camadas menos favorecidas ao medicamento, buscando um ponto de equilíbrio entre a necessidade de remunerar os elevados gastos com a pesquisa de novas drogas e o seu acesso por uma população de baixo poder aquisitivo, como a nossa.
Recentemente a Fundação Getúlio Vargas encaminhou à Secretaria de Acompanhamento Econômico estudo que mencionava que, embora os ricos no Brasil ganhem 40 vezes mais que os pobres, estes gastam com medicamentos a metade do valor gasto pelos ricos.
Segundo a pesquisa, a renda domiciliar dos 10% mais pobres é de R$ 125, enquanto a dos 10% mais ricos chega a R$ 4.738 (em média). Do que recebem, os 10% mais pobres gastam R$ 35,50 em remédios. Com ganhos de R$ 4.738, os 10% mais ricos gastam R$ 77,81, em média. Entre os mais pobres, 1,35% procura a farmácia para se consultar, 69,1% vão ao posto de saúde e apenas 3,98% vão a médico particular.
O que não está dito, mas é uma verdade, é que mesmo muitos dos que consultam médicos nos postos de saúde deixam de adquirir os remédios receitados por absoluta falta de recursos.
Dessa forma, a emenda constitucional apresentada será efetivo instrumento de justiça social, na medida em que permitirá aos governos ampliar a abrangência dos seus programas de assistência farmacêutica, de acordo com as momentâneas necessidades de erradicação ou controle desta ou daquela enfermidade.


Jair Meneguelli, 54, é deputado federal pelo PT de São Paulo. Foi o primeiro presidente da Central Única dos Trabalhadores (1983 a 1994).



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