São Paulo, Sábado, 17 de Julho de 1999
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A"famiglia"

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Não tenho nenhuma simpatia por Renan Calheiros. Como todo mundo, o associo ao grupo que chegou ao poder com Fernando Collor -e isso não o recomenda.
Tampouco tenho simpatia por Mário Covas, que me parece o tucano mais empostado, tipo matrona de Éfeso. No bate-boca desta semana entre os dois, fiquei ao lado de Renan. E explico:
Covas o acusou de contestar o presidente no caso da Polícia Federal. Com a leviandade que o caracteriza, FHC nomeara um suspeito de ser torturador para a chefia da PF. Renan foi contra. Suportou humilhações mas foi contra. Tinha ele, então, provas de que Campelo tolerara e participara da tortura de um ex-padre.
Arriscou o cargo mas contestou uma ordem moralmente indefensável. Ao contrário dos nazistas que cumpriam ordens para matar judeus e adversários, ele preferiu cair em desgraça. Foi um dos momentos mais dignificantes de nossa desmoralizada vida pública.
Ao acusá-lo de ter resistido ao presidente, Mário Covas revelou o tamanho de sua visão política. Políticos como ele, para usufruírem o poder, obedecem à ordem -seja ela qual for.
Esse tipo de político se inspira nas organizações da máfia. As ""famiglias" estabelecem regras que, sejam elas quais forem, terão de ser seguidas.
Às vésperas da pretendida reforma ministerial, FHC reuniu a ""famiglia" em São Paulo: Covas, Serra e outros ""capi" do tucanato. Ali decidiram quem receberia o peixe embrulhado em jornal.
O critério para distribuir esse tipo de aviso fúnebre é o mesmo que sustenta a máfia: a ordem, mesmo a imoral, tem de ser cumprida. Só assim a ""famiglia" terá condições de continuar no poder.



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