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CLÓVIS ROSSI
"Go home", mas...
TÓQUIO - Mal o freguês entra na loja
da cafeteria Starbucks na avenida
Hibiya, pertinho do Palácio Imperial,
a atendente canta: "Conitiuá" (boa
tarde), ao que a segunda atendente
faz coro.
O que há de errado nessa cena e o
que ela tem a ver com a crise em torno do Iraque?
Simples: o álacre coro de "conitiuá"
é a única coisa efetivamente japonesa disponível na loja da Starbucks.
Tudo o mais segue o modelo norte-americano da rede, tremendo êxito.
Que a cadeia McDonald's seja americana, vá lá. Hambúrguer e Estados
Unidos sempre foram sinônimos na
memória coletiva. Mas café? Café era
sinônimo, antes, de Brasil, hoje de
Colômbia e Brasil. Por que então não
há uma loja do "Café do Ponto" em
cada esquina de Tóquio?
Porque, no café como na guerra, no
hambúrguer como no comércio, os
Estados Unidos não pedem passagem
nem licença. Vão avançando, abrindo espaços, fincando suas bandeiras
mesmo em lugares em que, supostamente, poderia haver um choque cultural capaz de resistir à invasão.
Um país como a Argentina, por
exemplo, tendo sua carne o sabor que
tem, deveria ter tido capacidade de
resistir pelo menos um pouco à plastificação dos Mc's.
Como não há notícia de que "marines" estejam de plantão em cada lanchonete McDonald's ou em cada cafeteria Starbucks, só dá para concluir
que o sucesso do "made in USA" é resultado do fato de que as pessoas gostam do modelo. Ponto.
É verdade que as marchas do fim de
semana demonstram que as pessoas
não estão gostando do belicismo norte-americano, levado ao paroxismo
na presente administração.
Mas, em um debate em Davos, no
mês passado, Dewi Fortuna Anwar,
diretora de pesquisa do Centro Habibie (Indonésia), ironizou o antinorte-americanismo ao dizer que os manifestantes gritam "yankees, go home",
mas acrescentam: "E levem-nos com
vocês".
"Boutade" à parte, não é um mundo fácil este em que a mesma entidade é objeto de ódio e desejo.
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