São Paulo, quarta-feira, 18 de setembro de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O Brasil pode crescer?

ANDRÉ FRANCO MONTORO FILHO

A fragilidade fiscal é apontada, pela maioria dos economistas, como uma das principais causas das altas taxas de juros no Brasil. O receio de os gastos públicos excederem as receitas gera um clima de incerteza a respeito da capacidade futura do governo de pagar seus compromissos. Esse medo, aliado à já elevada dívida pública, cria pressões que dificultam, ou mesmo impedem, a almejada redução nas taxas de juros.
Essa redução é indispensável para que o Brasil possa crescer. Com taxas de juros menores haverá mais investimentos. Com mais investimentos, haverá criação de mais empregos, melhores salários e mais geração de renda. Com mais renda, aumentam as receitas públicas sem que haja aumento de impostos e, assim, o governo pode aplicar mais em seus programas sociais.
Dessa forma, fica clara a importância da responsabilidade e da disciplina fiscais para que o Brasil possa crescer.
Só que essa não é uma tarefa fácil. São constantes as demandas e pressões por mais gastos, especialmente na área social (saúde, educação, segurança, habitação popular etc.). E são demandas justas, dada a gravidade dos problemas sociais no Brasil.
Mas o fato é que o setor público já aplica na área social a maior parte de seus recursos disponíveis. Mais do que isso, o setor público já arrecada bastante. Nossa carga tributária é bastante elevada. Apesar disso, as demandas por gastos sociais não param de crescer.
Será que o problema é apenas de falta de verbas, ou será que os recursos não são aplicados da forma mais eficiente?
Há muito o que fazer para aumentar a eficiência dos gastos públicos. Isso porque a ação social no Brasil ainda padece de um viés estatizante, burocratizante e, muitas vezes, centralizador. Muitos ainda acreditam que tudo tem que ser feito pelo governo, contratando mais funcionários, criando mais órgãos. Com isso se despreza a participação da sociedade civil, das comunidades, das ONGs, do trabalho voluntário, do terceiro setor, enfim, de todas as formas de participação popular na execução de programas sociais.


Nossa carga tributária é bastante elevada. Apesar disso, as demandas por gastos sociais não param de crescer


A triste consequência dessa visão estatizante e centralizadora da ação social é que se gasta muito na burocracia, desviando recursos dos objetivos desejados. Ao mesmo tempo, não se aproveitam todos os recursos humanos, materiais e financeiros oferecidos pela comunidade. Este é, obviamente, um grande foco de ineficiência da ação social no Brasil que urge ser corrigido.
Valorizando e abrindo espaço para uma maior participação das comunidades, será possível gastar menos recursos orçamentários, com melhores resultados sociais. Assim, as pressões por mais verbas públicas serão reduzidas e a tarefa de equilibrar os orçamentos, de ter disciplina e responsabilidade fiscal se tornará menos difícil. Será removido um obstáculo à queda das taxas de juros e ao crescimento do Brasil.
Poderemos, desse modo, caminhar na construção do país que desejamos para nós, para nossos filhos e netos. Um país que se desenvolva com mais justiça social e mais oportunidades de trabalho para todos.
Enfatizei o aspecto financeiro, pois esse é o objetivo deste artigo. Mas não posso deixar de lembrar que ações sociais descentralizadas e com a participação das comunidades têm, certamente, muito mais probabilidade de beneficiar, de forma mais humana, aqueles que realmente mais precisam.


André Franco Montoro Filho, 58, economista, doutor pela Universidade Yale (EUA), é professor titular da Faculdade de Economia e Administração da USP e secretário licenciado de Economia e Planejamento do Estado de São Paulo.



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